quarta-feira, outubro 31, 2012

Furacão Sandy e a janela quebrada

A responsabilidade da Petrossauro

Deu hoje no Valor: "A Petrobras é isso tudo que é porque o Brasil vem ao longo dos últimos anos crescendo, se desenvolvendo, amadurecendo", disse Graça [Foster]. "É uma imensa responsabilidade que tenho não só com acionistas da Petrobras, mas com o meu país. Então esses dois lados não se separam jamais."

Entenderam? A presidente da Petrobras não está muito preocupada com a rentabilidade da empresa e o retorno aos acionistas, incluindo milhares de brasileiros via FGTS. Não! A estatal tem uma responsabilidade "com o país", e por isso ela é "tudo isso" (não sei exatamente o que seria tudo isso). O resultado? Vejam com os próprios olhos:





O duplipensar de Pimentel

Rodrigo Constantino

O ministro de Desenvolvimento, Fernando Pimentel, tem mesmo um uso das palavras bastante diferente do meu. Nesta matéria do site G1, consta que o governo pretende segurar o dólar acima de R$ 2. Ele teria dito:

O câmbio é flutuante mas o Banco Central tem agido usando os instrumentos de mercado no sentido de manter o patamar do câmbio brasileiro num estágio competitivo. Em dois reais por um dólar é um câmbio que traz conforto ao exportador.

O leitor entendeu direito? O câmbio é flutuante, mas deve "flutuar" muito perto de dois reais por dólar, quase imóvel. É um pêndulo que oscila sem sair do lugar, entendem? 

Mas não acabou. Justificando as medidas protecionistas do governo Dilma, que prejudicam os próprios brasileiros, Pimentel inverteu os fatos na maior naturalidade ao afirmar:

Os países desenvolvidos, que são campeões de protecionismo, dizem que nossas medidas são protecionistas quando o Brasil não está fazendo nada mais que proteger o seu mercado de práticas desleais. Nós não vamos admitir práticas predatórias e desleais no comércio internacional.

Ministro, qual fonte o senhor usou para constatar que os países desenvolvidos são mais protecionistas? Gostaria muito de saber, pois todas as fontes que tenho, incluindo a OCDE, mostram que o Brasil é bem mais protecionista do que os países desenvolvidos. Quer alguns exemplos? Verifique quanto custa trazer um carro coreano importado para o Brasil e quanto custa para os Estados Unidos. Faça isso para todos os outros produtos. 

Claro que as tarifas não são o único meio de impor barreiras protecionistas. Existem outras formas, como barreiras sanitárias, burocracia etc. Mas alguém acha realmente que o Brasil utiliza menos tais mecanismos do que os países desenvolvidos? Sério?

Segundo o Índice de Liberdade Econômica do Heritage Foundation, o Brasil está quase em centésimo lugar no ranking geral, e a abertura comercial tem sido responsável pela piora do posicionamento do país. Eis o que diz o estudo:

The trade weighted tariff rate is 7.6 percent. Non-tariff barriers and the use of antidumping measures are a cause for concern. Foreign investors are granted national treatment, but their activity is restricted in some sectors, including communications and mining.

Os Estados Unidos, que acusaram o Brasil de adotar medidas protecionistas, despertando a fúria do nosso governo, possuem tarifa média de apenas 1,8%, contra 7,6% do Brasil. A nota dos EUA em questão de comércio internacional é 86,4 (37º lugar no ranking), comparado a 69,7 do Brasil (126º lugar no ranking). Como acusar os EUA de serem mais protecionistas que o Brasil? Com base em qual critério?

Em suma, fica claro que o ministro Pimentel gosta de abusar do duplipensar orwelliano. Deve ser por tal habilidade que ele conseguiu juntar milhões prestando consultoria fora do governo...

Joguem uma bomba atômica logo!

Rodrigo Constantino

Sempre que uma desgraça natural se abate sobre um país, logo aparecem "especialistas" para apontar o lado bom da coisa: a reconstrução vai permitir uma expansão no PIB. A falácia da janela quebrada já foi derrubada por Bastiat no século 19, mas vários são os que nunca aprendem com a História. 

Entre vários exemplos, inclusive entre os nossos "especialistas", esse na CNBC se sobressai pela empolgação. Ele estima em cinco vezes o "multiplicador" dos gastos públicos com a reconstrução:


The positive multiplier effect of reconstruction after Sandy could be as much as five times, according to Frank Holmes, CEO and CIO of money manager U.S. Global Investors. If the cost of the damages comes up to $20 billion, the economic boost in terms of spending and activity could be $100 billion, he said.

Diante de tanta sapiência, resta-nos apenas divagar sobre o quão fantástico seria para a economia americana se alguém jogasse logo uma bomba atômica em Nova York. Deixando as perdas humanas de lado por um momento, e focando somente no aspecto econômico, quantos trilhões de dólares não seriam gerados no PIB se a cidade inteira fosse toda devastada?

É triste viver em um mundo em que este tipo de estupidez econômica, lastreada por muitos neokeynesianos, ainda encontra eco nas cabeças ocas dos nossos "especialistas", inclusive alguns com Prêmio Nobel na área. Não é verdade, Paul Krugman? 

Contra a avalanche, o jornalista desiste


Fábio Pannunzio, Folha de SP

Como jornalista a serviço de empresas de comunicação, fui processado só uma vez em 31 anos de profissão -a despeito de ter trabalhado a maior parte desse tempo como repórter investigativo e de ter feito dezenas de denúncias graves. E ganhei.
Há menos de quatro anos, criei um blog dedicado à reflexão política e à denúncia de iniciativas visando sufocar a liberdade de expressão, promover ou justificar a corrupção.
Ao longo de sua existência, tornei-me alvo de uma avalanche de processos judiciais. Foram oito ao todo, que me obrigaram a gastar uma fortuna com a contratação de advogados. Como blogueiro, descobri a condição de vulnerabilidade em que se encontram dezenas de jornalistas que decidiram atuar independentemente na internet.
Jamais fui condenado, mas é fato inquestionável que o exercício das garantias constitucionais é excessivamente custoso para quem não está respaldado por uma estrutura empresarial -ou não vendeu a alma ao diabo.
Contratar advogados, pagar custas e honorários, invariavelmente caríssimos, já constitui, em si, uma punição severa, mesmo para quem fatalmente será absolvido ao final de um processo sofrido e demorado.
Foi o que me levou à decisão de parar de publicar no blog.
Os dois primeiros processos vieram do Paraná, de onde uma quadrilha de estelionatários e traficantes de trabalhadores brasileiros para os EUA conseguiu censurar o blog durante alguns meses. A prisão dos denunciados fez com que a censura se extinguisse. Não satisfeitos e embora presos, passaram a pleitear uma indenização por danos morais.
De Mato Grosso chegaram outras quatro ações. O autor é o deputado estadual José Geraldo Riva, réu em 120 processos por peculato, corrupção e improbidade administrativa. Seu mandato foi cassado duas vezes por compra de votos, mas Riva ainda preside a Assembleia Legislativa do Estado, mesmo proibido de assinar cheques e ordenar despesas.
Boa parte dos textos teve como objeto o repúdio às práticas que o STF agora condenou como crimes praticados pelos mensaleiros do PT. O foco era o desvirtuamento ético, e não a questão partidária.
Também critiquei o mata-mata na segurança pública de São Paulo, Estado governado pelo PSDB. Daí brotaram dois outros processos.
O primeiro, uma queixa-crime do ex-comandante Paulo Telhada, que acaba de ser eleito vereador em São Paulo graças à imagem que ele alimenta de matador implacável. É o mesmo acusado de incitar no Facebook a campanha que culminou em uma série de ameaças ao repórter André Caramante, desta Folha.
O segundo é uma ação por danos morais movida pelo secretário de Segurança Pública de São Paulo, Antônio Ferreira Pinto, que novamente pôs o blog sob censura.
Não fui o único blogueiro a ter a sua atividade jornalística impedida por uma sequência de ações judiciais. Outro caso exemplar é a mato-grossense Adriana Vandoni, do blog "Prosa & Política". Desde 2009, a publicação está censurada judicialmente pelo mesmo José Geraldo Riva.
Não defendo prerrogativas de qualquer natureza para o jornalismo irresponsável. O exercício do jornalismo se torna deletério quando há deslizes éticos, com prejuízos enormes para quem se vê caluniado, difamado ou injuriado.
Também não me insurjo contra o direito dos ofendidos de pleitear reparação diante de distorções e erros da imprensa. O blog, aliás, sempre criticou o engajamento do jornalismo a soldo de políticos suspeitos, que atua como uma máquina de destruir reputações. Tal máquina ataca inclusive jornalistas, como Heraldo Pereira, da TV Globo, e Policarpo Júnior, da "Veja", vítimas de uma campanha difamatória hedionda movida pela blogosfera estatal.
Minha página eletrônica nunca aceitou qualquer forma de publicidade. Era mantida exclusivamente às expensas da minha renda pessoal auferida como repórter e apresentador da Rede Bandeirantes de Televisão. O exercício da liberdade de expressão, no ambiente cultural de uma democracia que ainda não se habituou à crítica (e a confunde com delitos de opinião), desafortunadamente, se tornou caro demais.
Mas sou forçado a concordar com os que entenderam minha atitude como capitulação. Porque o silêncio compulsório, que é o que desejam os inimigos da liberdade de expressão, só fará agravar o problema.

Brazil gripped by anti-corruption battle


By Joe Leahy in São Paulo, Financial Times



Normally, live coverage of events in Brazil is reserved for football matches.

But in recent weeks, the law professors at the Getulio Vargas Foundation (FGV), a Brazilian educational institution, have been running live commentary on something entirely different – the Mensalão (or big monthly allowance) case in the Supreme Court.

“This case is a result of the strengthening of the rule of law in Brazil,” said Oscar Vilhena Vieira, director of law at the FGV.So unprecedented is the case – in which the court, in televised hearings, has convicted senior members of Brazil’s former Workers’ Party, the PT, of corruption – that the professors have set up an on-campus “situation room” to provide live commentary to the media.

With the judges now moving to sentencing, interest in the trial is picking up.

Some Brazilians, jaded by decades of scandals in Brasília in which the perpetrators seemed to act with impunity, are suddenly daring to hope that the old ways of doing business may finally be changing in the vast emerging-market nation.

Those convicted in the Mensalão include former top lieutenants of Luiz Inácio Lula da Silva, the former president – such as his then chief of staff José Dirceu – who were found guilty of using public money to pay secret monthly stipends to opposition politicians in Congress in return for their support. Scores of people have been found guilty. The few sentences handed out so far have been tough.

“Brazil is taking this seriously because they see it as part of their role as an emerging power,” said Alejandro Salas, regional director for the Americas at the anti-sleaze organisation Transparency International, which ranks Brazil at 3.8 out of 10 in its corruption perceptions index (10 being regarded as “very clean”). This compares with fellow members of the big Bric emerging markets: Russia at 2.4, India at 3.1 and China at 3.6.

“They will differentiate themselves from the other emerging economies by doing this – by improving governance,” says Mr Salas.

One only needs to look at past cases, such as that of Ronaldo Cunha Lima, to understand the excitement in Brazil over Mensalão.

Cunha Lima, a former governor of the northern state of Paraíba as well as a senator, deputy of the lower house of Congress and a municipal councillor, shot and wounded a colleague in a restaurant in 1993. He died of cancer this year after having spent only three days in detention for the crime.

When his case finally came before a local court, he escaped judgment by becoming a senator in 2003. In Brazil, only the Supreme Court can handle criminal cases against federal politicians.

When the Supreme Court finally found time to hear the case in 2007, Cunha Lima resigned from the Senate, returning the matter to square one in the inefficient local court system.

“This man has manoeuvred and used tricks to escape trial for 14 years,” Joaquim Barbosa, the Supreme Court justice who is leading the Mensalão case, was quoted as saying at the time.

Yet the case was only one of many: from that of Fernando Collor, a former president, who is today a senator despite being impeached when he was in office for corruption, to that of his father, Arnon Mello, a senator who shot dead a colleague in the Senate in 1963 but never faced trial.

Indeed, in the past 30 years, 72 politicians have been murdered in Brazil, according to a list compiled by Carta Capital magazine. Corruption and political violence remain entrenched.

“You have to keep in mind that in Brazil until recently we have had cases of politicians killing other politicians in public and not going to jail,” said João Augusto de Castro Neves, an analyst with Eurasia Group.

The Mensalão case points to wider changes taking place in Brazil, according to Transparency International’s Mr Salas. The country is managing to couple institutional improvements with more robust enforcement. Traditionally, Latin American countries have struggled to do both in tandem.

Among the institutional reforms, Brazil has introduced the ficha limpa, or “clean slate” law, which prevents people convicted of crimes from running for public office. A law that also prevented the Supreme Court from trying federal politicians without prior approval from Congress has been revoked.

On the enforcement side, the role of the Supreme Court and independent public prosecutors, envisaged in Brazil’s 1988 post-dictatorship constitution as a check and balance on the executive, is beginning to take effect.

“It`s too early to celebrate, but at least the process has started,” says Mr Salas.

Others caution that the optimism should not be overdone. Campaign finance, a source of much corruption, remains murky, as are public tenders for jobs such as construction works and bus lines. They also point to the growing size of government spending in Brazil.

“This government is becoming more interventionist, so you have more opportunities for corruption,” says Luciano Dias, a political consultant in Brasília.

Still, Mensalão is leading some people, especially the young, to dare to take an interest in politics again, says Oliver Stuenkel, assistant professor of international relations at FGV.

“It’s amazing to see optimism without cynicism,” he says.

terça-feira, outubro 30, 2012

Ben Bernanke: Currency Manipulator


By MARY ANASTASIA O'GRADY. WSJ


The dollar is our currency, but it's your problem.
—U.S. Treasury Secretary
John Connally, 1971
In the final televised presidential debate, Mitt Romney promised that if he is elected on Nov. 6 he will "label China a currency manipulator" on "day one" of his presidency. He also pledged to pay more attention to trade with Latin America, noting that the region's "economy is almost as big as the economy of China."
To be consistent, Mr. Romney should call out the Federal Reserve on day two for engaging in its own currency manipulation by way of "quantitative easing," which undermines the value of the dollar relative to Latin American currencies. After all, no one can expect a healthy trade relationship with the region if the Fed is goading U.S. trading partners into competitive currency devaluations.
But that's not the main reason why a new U.S. president should want to rein in the Fed. The greater worry is the one that International Monetary Fund Managing Director Christine Lagarde warned about at the IMF's October meeting in Tokyo. Easy money from the central banks of developed countries, she said, creates the risk of "asset price bubbles" in emerging economies.
If history is any guide, such bubbles are likely to lead to financial crises that in turn lead to setbacks in development. Aside from the damage that does to middle-income countries like Brazil, emerging-market financial crises also undermine U.S. economic and geopolitical objectives.
From September 2008 through the end of 2011, Mr. Bernanke's Fed created $1.8 trillion in new money. But Fed policy makers were only warming up. In September they announced that they will engage in a third round of quantitative easing—that is, more money creation, ostensibly to spur growth and thus bring down unemployment—at a rate of $40 billion per month with no deadline.
With so many dollars sloshing around in U.S. banks and with a fed-funds rate set near zero, investors have found it hard to earn a decent return. The scavenger hunt for yield has sent dollars rushing into emerging markets where, as they are converted into local currency, they put upward pressure on the exchange rate.
Brazil has experienced this in spades. Brazilian Finance Minister Guido Mantega has complained bitterly about it because in his mind the higher relative value of the realmakes Brazil worse off.
Bloomberg
U.S. Federal Reserve Chairman Ben Bernanke
In Mr. Bernanke's remarks at the IMF meeting in Tokyo, he suggested that emerging economies ought to simply let their currencies appreciate rather than "resist appreciation" through "currency management." To do otherwise, he noted, can mean "susceptibility to importing inflation," which means making Brazilians poorer.
Mr. Bernanke has a point. The closed, heavily regulated Brazilian economy is held back by too much government, not a strong real.
Indeed, the quest for a weak currency to boost exports is counterproductive if the goal is development. As former Salvadoran Finance Minister Manuel Hinds wrote earlier this month for the Atlantic magazine's new online publication, Quartz, the Brazilian boom in industrial production, which stirred "the idea that [Brazil] would become the engine of the world," came from "the inflow of dollars that Mr. Mantega hates so much."
But Mr. Bernanke's dismissive posture toward emerging economies missed the larger point. As Mr. Hinds also pointed out, "the exceptional prosperity would last only as long as the dollars kept on coming." And there's the rub. The boom is an artificially high valuation of the Brazilian economy, produced only because Mr. Bernanke has made the world awash in dollars.
The sustainability issue is troubling. As Bank of England Governor Mervyn King noted in a speech last week: "When the factors leading to a downturn are long-lasting, only continual injections of [monetary] stimulus will suffice to sustain the level of real activity. Obviously, this cannot continue indefinitely."
In a perfect world, the end of the dollar flows—or a downturn in soaring commodity prices when investor expectations begin to shift—would simply mean an economic slowdown. But booms are almost always accompanied by credit expansions, and Brazil's is no different. Since 2004, bank credit has grown to 167% of gross domestic product from 97%.
What happens when a leveraged economy, living on accommodative monetary policy, suddenly finds the spigot turned off? Ask Americans who were on the receiving end of Fed tightening in 2007.
In Tokyo, Mr. Bernanke spoke to the world the way former U.S. Treasury Secretary John Connally spoke to the G-10 in Rome in 1971 after the U.S. abandoned the Bretton Woods agreement that had tied the dollar to gold: Get over it. We do what we want.
That attitude wasn't constructive for Americans or the rest of the world. If some future U.S. president intends to restore American prestige in economic leadership, restoring Fed credibility as a responsible manager of the world's reserve currency is a necessary first step.

Capitalismo sem doping


Rodrigo Constantino, O GLOBO

Lance Armstrong foi banido do esporte pela União Ciclística Internacional por acusação de doping. Ele perdeu seus sete títulos da Volta da França, assim como oito patrocínios nos últimos meses. Antes um exemplo para muitos, o atleta agora se vê em desonra. O público não tolera uma competição desleal nos esportes.
Infelizmente, o mesmo não ocorre quando se trata de economia. Muita gente acha natural que o governo crie privilégios e incentivos, beneficiando certos empresários. O governo Dilma parece ter adotado com gosto o manual nacional-desenvolvimentista de seleção dos campeões nacionais, como na era Geisel.
Algumas empresas agraciadas por critérios arbitrários recebem incentivos que destroem a essência do capitalismo, que é a livre concorrência. Barreiras protecionistas, cotas nacionais, empréstimos do BNDES com juros subsidiados, ligações espúrias com as estatais, enfim, há diversas formas de se manipular o mercado, análogas ao uso de doping nos esportes. Mas poucos reclamam.
O bilionário Eike Batista fala abertamente deste "capitalismo de compadres" como se fosse algo positivo. Em entrevista recente, o empresário disse que o governo deveria investir mais em suas empresas. Seu grupo EBX já recebeu mais de R$ 8 bilhões do BNDES em quatro anos. São taxas camaradas, a que toda a torcida do Flamengo gostaria de ter acesso.
Em uma espécie de surto megalomaníaco ao estilo Lula, Eike Batista chegou a afirmar: "Alguém vai ter que fazer uma estátua para mim em algum lugar". Não quero ser injusto aqui: Eike tem lá seus méritos. É corajoso em suas empreitadas, não tem vergonha de sua riqueza, algo importante em um país que considera o sucesso uma "ofensa pessoal". Mas sua simbiose com o governo não permite que ele seja visto como um ícone do capitalismo. Ao menos não do modelo liberal.
Eike Batista representa o capitalismo de Estado, assim como seu colega da lista de bilionários da Forbes, Carlos Slim. São casos de inegável sucesso, mas com forte turbinada estatal. Típico da América Latina, cuja presença do Estado na economia ainda é muito grande, criando incentivos perversos onde o lobby vale mais do que o mérito e o investimento em competitividade.
Outro caso escandaloso é o da JBS, que já recebeu mais de R$ 10 bilhões do BNDES, agora sócio da empresa. Em 2005, ela faturava menos de R$ 4 bilhões por ano. Em 2010, o faturamento já passava dos R$ 55 bilhões. A "Boibras" se tornou um gigante graças ao empurrão do governo. Em contrapartida, ela foi um dos maiores doadores corporativos para a campanha de reeleição de Lula em 2006.
Esses grandes empresários latino-americanos não podem ser comparados a gente como Steve Jobs (Apple), Michael Dell (Dell), Larry Ellison (Oracle), Jeff Bezos (Amazon), Bill Gates (Microsoft), Larry Page (Google) e Mark Zuckerberg (Facebook). Estes empreendedores não contaram com o doping estatal.
Não por acaso, são todos do setor de tecnologia, onde há menos intervencionismo. Seu sucesso foi decorrente apenas de trocas voluntárias com seus clientes.
Claro que o sistema faz toda diferença do mundo. Em um país como o Brasil, onde uma canetada da presidente pode selar o destino de um setor inteiro, qualquer empresário grande precisa manter boas relações com o governo. Além disso, se existe o BNDES, claro que todos vão fazer de tudo para entrar na lista de beneficiados. Faz parte do jogo. O que está errado são as regras do jogo por aqui.
Por isso acho injusto culpar somente os empresários que mamam nas tetas estatais. A culpa maior é do nosso modelo, com poder demais concentrado no Estado. Se, por um lado, é preocupante ver Eike Batista transformado em ícone do capitalismo, também é exagerado demonizá-lo (ainda que ele mereça duras críticas). Não é fácil ser um grande empreendedor no Brasil sem as muletas estatais. Eles existem, e são verdadeiros heróis. Mas trata-se de algo raro.
O que precisamos, portanto, é alterar as regras do jogo. Precisamos de bem menos governo, e bem mais mercado livre. Acima de tudo, como defende Luigi Zingales em seu excelente livro "A Capitalism for the People", nós precisamos criar um ambiente de pressão social contra privilégios estatais. É preciso recuperar os valores éticos que rejeitam a ideia de que o importante é vencer, custe o que custar.
Um atleta pego com doping cai em desgraça. Um empresário que depende das vantagens do estado deve ser visto como um concorrente desleal, não um exemplo a ser seguido. Precisamos de regras iguais para todos. Precisamos de um capitalismo sem doping.

O tamanho não conta

João Pereira Coutinho, Folha de SP


Sérgio Dávila escreveu nesta Folha a favor da polarização em política. Será que o sistema brasileiro, com seus 30 partidos, é mais desejável do que o sistema bipartidário norte-americano, onde republicanos e democratas se alternam no poder? Dávila pensa que não --e pensa muito bem.
Há anos que, em Portugal, travo a mesma batalha: a democracia lusa estaria melhor servida se existissem dois grandes partidos --um de esquerda, outro de direita-- capazes de deterem maiorias sólidas e de serem solidamente responsabilizados por seus atos.
Não é uma batalha fácil: sempre que alguém levanta a bandeira do bipartidarismo, chovem acusações de fechamento democrático e de horror ao pluralismo. Em minha defesa, só posso invocar o nome de um dos maiores apologistas da "sociedade aberta": o filósofo Karl Popper.
Em 1987, Popper, então com 85 anos, esteve em Lisboa para uma notável conferência sobre a sua vida e, em especial, a sua teoria da democracia.
Sobre a vida, os fatos são conhecidos: nascido em Viena em 1902, Popper atravessou a Primeira Guerra Mundial; encantou-se com o comunismo; desencantou-se logo a seguir; assistiu, horrorizado, à ascensão do nazismo; e construiu uma impressionante obra filosófica no exílio.
Mas nesse encontro em Lisboa, o velho filósofo concentrou-se sobretudo na sua teoria da democracia. Para Popper, a democracia é um problema eminentemente prático e técnico. Ela procura saber como remover os maus governantes sem derramamento de sangue.
Naturalmente que cabe ao povo, pela força do voto, essa punição exemplar. Mas Popper sublinhava que essa punição só é verdadeiramente exemplar --um "dia do juízo final", dizia ele-- em sistemas tendencialmente bipartidários.
A afirmação pode soar bizarra: o aumento do número de partidos deveria significar mais escolha, mais ideias em circulação, melhor distribuição de poder e influência.
Um erro, avisava Popper. Para começar, a existência de muitos partidos traz dificuldades acrescidas à formação de governos coesos --para não falar do funcionamento e da duração desses governos.
Em Portugal, esse aviso é uma evidência empírica: desde a instauração da democracia, há mais de 35 anos, o país teve oito governos de coalização. Nenhum deles --repito: nem um-- chegou ao fim do seu mandato. Só governos de um único partido o conseguiram.
Aliás, o atual governo de coalização ilustra o ponto: eleito há pouco mais de um ano, as fissuras são já gritantes. Poucos creem na sua sobrevivência a curto prazo.
Mas há mais: sistemas pluripartidários tendem a conceder aos pequenos partidos um poder que pode revelar-se, ironicamente, antidemocrático. Se a democracia significa a escolha da maioria, não cabe a uma minoria determinar a vontade livremente expressa das maiorias.
Os pequenos partidos, explicava Popper, acabam por adquirir um poder desproporcionado na formação de governos e no processo decisório desses governos.
Finalmente, o argumento de peso: enganam-se os que pensam que sistemas bipartidários têm menor flexibilidade ideológica. Os dois grandes partidos americanos, por exemplo, apresentam uma capacidade de reforma e autocrítica internas sem paralelo com qualquer outro sistema pluripartidário.
Essa capacidade --mais: esse imperativo de reforma e autocrítica-- está diretamente ligada com a dimensão e o significado das derrotas eleitorais.
Nos Estados Unidos, quem perde, perde a sério. A derrota não é apenas um prejuízo facilmente dissolúvel em dezenas de pequenos partidos. É uma derrota clara que exige uma resposta clara de explicação para essa derrota; e de busca de novas ideias para regressar ao poder.
Como dizia Popper, nas democracias bipartidárias os partidos vivem "em alerta permanente". O que significa uma atenção redobrada (e permanente) às necessidades reais do país e, claro, ao comportamento do partido rival na forma como governa e nas decisões que toma enquanto está no poder.
Bipartidarismo é maturidade, escrevia Dávila. Acrescento: maturidade e qualidade. Quem disse que o tamanho não conta estava só a pensar na quantidade das siglas partidárias.

segunda-feira, outubro 29, 2012

A filosofia de lavar a louça

Luiz Felipe Pondé, Folha de SP

Fala-se muito de como o "Primeiro Mundo é isso e aquilo". Acho isso papo de vira-lata. Toda vez que você ouvir alguém falando que a Europa "é outra coisa", você está diante de um vira-lata rondando a lata de lixo dos outros. A mesma coisa vale para os EUA, ainda que, nesse caso, vira-latas de esquerda jamais elogiem os EUA, mesmo que comprem iPads lá.
Mas independentemente dessa breguice de vira-lata querendo fingir que entende de vinhos, há um detalhe na vida europeia e norte-americana que vale a pena discutir: a vida doméstica e suas tarefas.
Mas, sintomaticamente, os vira-latas nunca falam disso, porque a própria condição de vira-lata os impede de entender ou mesmo enxergar esse detalhe. O sonho do vira-lata é fingir que é llhasa apso e por isso acha que ser um llhasa é desfilar bolsa Prada no JK Iguatemi.
O Brasil é terra de atrasado, corrupto, esculhambado, inculto, novo rico e por aí vai. Tudo isso é verdade. A prova disso é que aqui luxo é ostentação. Suspeito que grande parte do que há de fato de bom na Europa e nos EUA em termos de hábitos e costumes (portanto, estamos falando de moral) se deve ao fato de que nesses lugares as pessoas se movimentam de modo diferente no cotidiano das suas tarefas.
Sempre ouvi os mais velhos dizerem que "o costume de casa vai à praça" e isso é a mais pura verdade. Além de fazerem sexo melhor, suspeito também que os mais velhos entendiam bem melhor do que é essencial, principalmente porque não tinham essa parafernália de ideologia e outros quebrantos bobos como ferramenta de análise do mundo.
Eles observavam a vida sem a presunção de ter descoberto a chave do mundo, como nossos contemporâneos viciados em "teorias de gabinete", como dizia Edmund Burke.
Lembro-me bem que minha filha, chegada à França com cerca de dois anos de idade, chorava porque não podia lavar louça como meu filho, seu irmão, mais velho do que ela nove anos. Isso é sintomático de muitos outros pequenos detalhes: para ela, lavar a louça era parte de ser da família. Meu filho, minha mulher e eu partilhávamos todo o cuidado com a vida cotidiana, inclusive o cuidado com a caçulinha.
Em países como a França, Alemanha, Israel, EUA e outros semelhantes, você é responsável por tudo que acontece na sua casa. Roupa, comida, limpeza, compras, resolução de pequenos problemas logísticos, enfim, da sustentação da vida.
As casas (menos nos EUA, mas ainda assim a ocupação de espaço é diferente da nossa) são menores e mais simples, mesmo que com mais parafernália tecnológica, quando você tem condição de tê-la.
O que me chama atenção em relação às casas não é só seu tamanho, mas a ocupação do espaço. No Brasil temos a famosa sala de visita que, se você "está bem de vida", deve ser completamente inútil e parecer desocupada. Por isso, sempre suspeito que manter uma parte da casa sem uso é signo de vira-lata.
As aristocracias antiga e medieval, as únicas verdadeiras, também não tinham castelos sem uso. Burguês, e aristocracia falida, com "castelo" na zona leste ou nos Jardins é coisa de "wannabe", como dizem meus alunos.
Goethe, em seu maravilhoso "Os Anos de Aprendizado de Wilhelm Meister", descreve o que é a casa de um burguês: ter mais coisas do que precisa e não ter uma relação de uso e necessidade real com os objetos da casa.
Este é o caso. Uma sala de visitas imaculada faz você parecer rico o bastante para manter parte da sua casa sem uso e, com isso, você trai sua breguice burguesa. Acho que grande parte de nossas agruras vem do fato de que não lavamos louça com frequência e de que temos cômodos dissociados de nosso cotidiano e necessidades.
Basílio Magno (século 4) criou a regra da vida monástica: estudar, contemplar, trabalhar. Uma atividade alimenta a outra, e as três formam o espírito. A sabedoria monástica é uma das maiores criações do espírito humano.
Entre nós, dar "tudo" para os filhos até os 40 anos de idade é signo de sermos bons pais. E com isso preparamos adultos retardados e com futuras salas de visita cheias de fantasmas de nossa pobreza de espírito.

domingo, outubro 28, 2012

A religião do momento


Leandro Narloch, Folha de SP
CARO IRMÃO, você que está vivendo uma situação desesperadora, que se sente esgotado, estressado, sem saída, eis aqui um convite. Junte-se a nós, dê uma chance ao poder divino da política, venha descobrir que o Estado pode salvar a sua vida.
O jovem cheio de esperança, a senhora solitária que veio até aqui nos conhecer, tenham certeza que há um candidato olhando para vocês, um vereador proibindo alguma coisa na cidade, uma presidente com poder e sabedoria guiando o país.
É verdade, irmãos, que os últimos tempos não têm favorecido a crença no Estado. Há séculos pregamos que a educação, a saúde e o transporte público vão funcionar, e o que vemos são enfermeiras de postos de saúde injetando café com leite na veia de senhoras idosas.
Apesar disso, irmãos, o Estado nos pede que ignoremos esses problemas e perseveremos na fé -a fé de que um dia algum político nos conduzirá a um reino de paz e justiça social.
Irmãos, a mensagem mais importante a vocês é sobre dois graves riscos que nós corremos nas eleições deste domingo. O primeiro deles é que religiões influenciem a disputa para a chefia de nossos alvíssimos palácios. Isso é um absurdo, irmãos!
Religiões se baseiam em mundos imaginários, irmãos! Em ideias obscuras! Nós, ao contrário, lidamos com o mundo real! Com princípios científicos! Por exemplo, quando almejamos postos de saúde com a mesma qualidade dos melhores hospitais particulares, ou bancos estatais livres da influência de partidos: é a realidade, senhores! Nossos sonhos são perfeitamente realistas, irmãos!
A outra ameaça é eleger sacerdotes que não creem nos poderes do Estado. Gritem comigo: eles são hereges! Eles são demônios! Eles são neoliberais! Querem privatizar a Entidade Nacional do Reino Estatal! Precisamos atirá-los nos calabouços das derrotas eleitorais, irmãos!
Calma, senhora, não precisa jogar cheques e notas em nossos pés. Os sacerdotes fiscais já trataram de reter parte de seu salário e embutir nos preços do mercado a taxa de manutenção de nossas obras divinas. O valor está passando um pouco do dízimo -beira 40% de sua renda- mas acredite, minha senhora: todo ele é destinado ao bom caminho, à construção do paraíso escandinavo, ao poder infinito e sagrado do Estado.
Leandro Narloch jornalista e autor de "Guia Politicamente Incorreto da História do Brasil" e coautor de "Guia Politicamente Incorreto da América Latina".

Avenida Brasil

Ferreira Gullar, Folha de SP

Faz muitos anos que uma novela de televisão não desperta tanto interesse do público noveleiro quanto esta "Avenida Brasil", cujo derradeiro capítulo foi ao ar na noite de sexta-feira, 19 deste mês.

De fato, a novela conquistou não apenas os aficionados do gênero, como muito mais gente, até mesmo quem nunca assiste a novelas. A coisa chegou a tal ponto que, segundo foi noticiado, a presidente Dilma determinou o adiamento do comício pela eleição de Haddad, em São Paulo, que deveria realizar-se na noite daquela sexta-feira, temendo que não fosse quase ninguém.

Outro indício, jamais registrado antes, desse interesse pela novela de João Emanuel Carneiro foi o pique de consumo de energia elétrica, logo após a exibição dos capítulos finais. É que o pessoal deixava de fazer qualquer coisa -desde cozinhar até tomar banho ou ligar o computador- para só fazê-lo após o fim do capítulo. A novela interrompia o curso da vida. Isso foi o que ouvi de um repórter de televisão.

Qual a razão de tanto sucesso, admito não saber ao certo. Imagino muitas explicações mas, se arrisco uma delas, diria que é o tipo de dramaturgia adotado pelo autor. Uma das características do gênero é a morosidade da ação dramática, que resulta numa série de outras consequências.

A razão disso é que a novela tem que durar meses, o que obriga a um número fantástico de capítulos -esta, de que falamos aqui, teve nada menos que 179, transmitidos durante sete meses.

Defendo a tese de que toda dramaturgia não dura mais que uma hora e meia a duas horas. Essa é a duração de quase todos os filmes e peças teatrais. Não existe dramaturgia para durar sete meses.

Em função disso, os nossos telenovelistas são obrigados a criar histórias paralelas, que se mesclam à história principal, tudo com o propósito de fazer com que a novela dure tanto. Isso, como já disse, faz com que a ação dramática se torne prolixa e lenta.

Essa lentidão não houve na "Avenida Brasil". Pelo contrário, nela, a ação dramática era sempre intensa, e isso se deveu ao fato de que, a cada capítulo, inesperados conflitos surgiam envolvendo os diferentes núcleos e os muitos personagens.

O preço pago pelo autor, por lançar mão de tais recursos, foi a implausibilidade de certas situações e a incoerência de atitude dos personagens, mas que João Emanuel, com sua competência, conseguiu muitas vezes superar, ganhando pelo menos a tolerância do telespectador.

É certo que, apesar dessa originalidade, em comparação com a forma dramatúrgica comumente adotada nas telenovelas, João Emanuel também se valeu de um recurso usado por todos os teledramaturgos desde o sucesso obtido pela vilã Odete Roitman (1988). Não por acaso, a execrável Carminha se tornou a principal agente da ação dramática de "Avenida Brasil".

Neste ponto, esta novela só difere das demais pelo grau de vilania e crueldade que atribuiu à personagem. Aliás, nisto, ela é quase imbatível, já que quase todos os personagens são de uma sordidez sem limites. Com a agravante de que os que escapam disso -que não matam, não traem, não subornam nem se deixam subornar- são idiotas ou tolos, como Tufão, marido de Carminha, o corno manso por excelência.

Para minha surpresa, ouvi num debate de televisão que o êxito de "Avenida Brasil" se deve ao fato de ser ela o retrato verdadeiro da nossa sociedade. Se isso é correto, moro em outro país sem o saber, já que as pessoas com quem convivo e as famílias que conheci ao longo de minha vida -e bota vida nisso- nem de longe se parecem com os personagens criados por nosso brilhante teledramaturgo.

Certamente li nos jornais e ouvi contarem histórias escabrosas, implicando traições, homicídios e falcatruas, mas nunca na escala em que nos mostrou a novela, onde todo mundo é bandido ou babaca. Pretenderia o autor nos convencer de que quem não se torna bandido é babaca? Seria uma péssima lição.

Mas não se trata disso. Novela é ficção, não é a realidade, nem poderia ser. Como se sabe, a arte existe porque a vida não basta. E os bons sentimentos não dão boa dramaturgia. Haja vista o último capítulo da novela.

sexta-feira, outubro 26, 2012

O peso do governo na bolsa

Dilma e o Ibovespa

Quando Dilma assumiu o governo, o Ibovespa estava em 70.000 pontos (e graças aos estímulos artificiais de Lula para eleger seu "poste"). À exceção de um curtíssimo período em que o índice bateu nos 73.000 pontos, ele jamais voltou ao patamar em que a "presidenta" encontrou quando chegou ao poder. Hoje, encontra-se quase 20% ABAIXO daquele patamar, isso mesmo lembrando que a inflação acumulada neste período foi de quase 20%. Ou seja, as empresas brasileiras, medidas pelo Ibovespa, perderam quase 40% de seu valor real de mercado até agora na gestão Dilma! O desempenho de nossa bolsa é um dos piores do mundo! Mas ainda há quem celebre o nacional-desenvolvimentismo dessa turma. Vai gostar do fracasso assim lá em Cuba...


Apagão estatal


Rodrigo Constantino, para o Instituto Liberal

Meu novo livro, “Privatize Já”, que será lançado pela editora LeYa em novembro nas principais capitais do país, conta com a seguinte frase na epígrafe: “Se colocarem o governo federal para administrar o deserto do Saara, em cinco anos faltará areia”. O alerta jocoso, feito por Milton Friedman, parece perfeito para o Brasil.

Se o estado for encarregado de prover eletricidade num país cheio de rios, vento, urânio e outras fontes de energia, qual vai ser o resultado? Apagão. Não importa se são os tucanos ou os petistas no governo, se a culpa é atribuída à falta de chuva ou aos problemas técnicos nas linhas de transmissão, o fato é que o Brasil tem tudo para esbanjar fartura de energia barata, mas a gestão do setor, predominantemente estatal, mostra-se incapaz de realizar um bom trabalho.

Na madrugada desta sexta-feira, a região nordeste e parte da região norte enfrentaram novos problemas de apagão. O diretor-geral do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) culpou um incêndio causado por um curto-circuito em uma linha de transmissão. Os consumidores, naturalmente, não estão muito preocupados com as justificativas e desculpas de sempre. Eles querem apenas garantia de eletricidade a um bom preço. Algo que o estado como gestor jamais será capaz de oferecer.

Pensemos por um minuto na seguinte questão: quais são os setores mais caóticos no Brasil? Infraestrutura em geral (transportes públicos, aeroportos, portos, estradas e eletricidade), educação pública, saúde pública, segurança pública etc. Será uma incrível coincidência todos os setores capengas dependerem tanto da gestão estatal? Ou será que tem alguma coisa a ver com as falhas estruturais nos mecanismos de incentivos da gestão burocrática?

Quem ler meu novo livro saberá a resposta. Contra o apagão, só há uma solução: privatize já!

PS: Devemos ser compreensivos com os ministros do STF, que demonstram confusão no momento da dosimetria. Não estão acostumados a definir penas para políticos e apaniguados...

terça-feira, outubro 23, 2012

Nigel Farage straight to the point!


Miniatura de periguete

Rosely Sayão, Folha de SP

Que as crianças têm cada vez menos infância é um fato já constatado e conhecido por muita gente.
Há mais de 20 anos que teses, ensaios e livros produzidos por estudiosos das mais diversas áreas do conhecimento alertam para essa questão tão importante.
Não há dúvida de que foi o mundo que mudou. Muitas pessoas acreditam que as crianças da atualidade são diferentes porque já nascem assim: mais conectadas com o que acontece à sua volta, mais cientes do que querem, mais sabidas e muito menos afeitas à obediência.
Mas não. O que acontece, na verdade, é que elas são estimuladas desde o primeiro minuto de vida, e os adultos que as cercam estão ocupados demais consigo mesmos e com sua juventude para ter a disponibilidade de construir autoridade sobre as crianças.
Além disso, os adultos estão muito orgulhosos com os feitos dos filhos que aí estão, cada vez mais, simplesmente para satisfazer os caprichos dos pais.
Tudo -absolutamente tudo- o que acontece no mundo adulto está escancarado para as crianças.
Estão escancarados aos mais novos crimes e castigos, corrupção na prática política, desumanidades, destruição e violência de todos os tipos, desde a mais pesada à mais cotidiana (que nem sempre é reconhecida como uma forma de violência).
E as crianças sofrem e sofrem com tudo isso, mas sem saber. Ainda. Elas ainda não sabem que mais de dez por cento de suas vidas -a parte que corresponde ao período chamado de infância, no qual poderiam se dedicar a brincar de maneira infantil- está se esvaindo em consequência dos caprichos dos adultos. Para ilustrar esse ponto, vou citar aqui dois fenômenos recentes.
Creio que você já ouviu, caro leitor, a palavra "periguete". Já está até no dicionário.
É uma expressão da linguagem informal, surgida na periferia da capital baiana, que tem diversos significados, dependendo de quem a usa e em que contexto.
No quesito aparência, o termo se refere a mulheres que se vestem com roupas curtas, decotadas e muito justas, deixando muito corpo em exposição.
Os trajes usados por essas mulheres são considerados vulgares, mas há quem não aceite esse sentido. Hoje, temos estilistas dedicados a criar linhas de roupas com esse perfil, tamanho é o sucesso que o estilo tem feito com o público feminino.
Pois é: agora muitas mães estão vestindo suas filhas como "periguetes".
A garotada gosta de aderir ao personagem principalmente porque papéis com esse estilo, em novelas, têm tido bastante destaque e seduzido a criançada.
Pudera: corpo à mostra, expressão corporal exagerada, voz demasiadamente alta tem tudo a ver com criança, não é verdade?
O que as crianças desconhecem é o caráter extremamente erotizado dessa fantasia que elas andam vestindo.
Claro que, para as crianças, é apenas o chamado "look periguete" que importa e não o comportamento de mulheres adultas que assim se reconhecem. Mas precisamos entender que erotismo é coisa de gente grande para gente grande.
Agora, como se não bastasse travestir crianças pequenas como "periguetes", muitos pais também as levam a "baladinhas" com direito a DJ, muita dança, muita gente, pouca iluminação etc. Igualzinho ao que acontece no mundo adulto.
Enlouquecemos ou o quê?
Com a expectativa de vida em torno dos 75 anos, por que não deixamos nossas crianças em paz para que possam viver sua infância? Afinal, depois de crescidas, elas terão muito tempo para fazer o que é característico do mundo adulto. Adiantar por quê?
Em nome de nossa diversão, só pode ser.

A condenação do PT

Marco Antonio Villa, O Globo

O julgamento do mensalão atingiu duramente o Partido dos Trabalhadores. As revelações acabaram por enterrar definitivamente o figurino construído ao longo de décadas de um partido ético, republicano e defensor dos mais pobres.
Agora é possível entender as razões da sua liderança de tentar, por todos os meios, impedir a realização do julgamento. Não queriam a publicização das práticas criminosas, das reuniões clandestinas, algumas delas ocorridas no interior do próprio Palácio do Planalto, caso único na história brasileira.
Muito distante das pesquisas acadêmicas — instrumentalizadas por petistas — e, portanto, mais próximos da realidade, os ministros do STF acertaram na mosca ao definir a liderança petista, em 2005, como uma sofisticada organização criminosa e que, no entender do ministro Joaquim Barbosa, tinha como chefe José Dirceu, ex-presidente do PT e ministro da Casa Civil de Lula.
Segundo o ministro Celso de Mello: “Este processo criminal revela a face sombria daqueles que, no controle do aparelho de Estado, transformaram a cultura da transgressão em prática ordinária e desonesta de poder.” E concluiu: “É macrodelinquência governamental.” O presidente Ayres Brito foi direto: “É continuísmo governamental. É golpe.”
O julgamento do mensalão desnudou o PT, daí o ódio dos seus fanáticos militantes com a Suprema Corte e, principalmente, contra o que eles consideram os “ministros traidores”, isto é, aqueles que julgaram segundo os autos do processo e não de acordo com as determinações emanadas da direção partidária.
Como estão acostumados a lotear as funções públicas, até hoje não entenderam o significado da existência de três poderes independentes e, mais ainda, o que é ser ministro do STF.
Para eles, especialmente Lula, ministro da Suprema Corte é cargo de confiança, como os milhares criados pelo partido desde 2003. Daí que já começaram a fazer campanha para que os próximos nomeados, a começar do substituto de Ayres Brito, sejam somente aqueles de absoluta confiança do PT, uma espécie de ministro companheiro. E assim, sucessivamente, até conseguirem ter um STF absolutamente sob controle partidário.
A recepção da liderança às condenações demonstra como os petistas têm uma enorme dificuldade de conviver com a democracia.
Primeiramente, logo após a eclosão do escândalo, Lula pediu desculpas em pronunciamento por rede nacional. No final do governo mudou de opinião: iria investigar o que aconteceu, sem explicar como e com quais instrumentos, pois seria um ex-presidente.
Em 2011 apresentou uma terceira explicação: tudo era uma farsa, não tinha existido o mensalão. Agora apresentou uma quarta versão: disse que foi absolvido pelas urnas — um ato falho, registre-se, pois não eram um dos réus do processo. Ao associar uma simples eleição com um julgamento demonstrou mais uma vez o seu desconhecimento do funcionamento das instituições — registre-se que, em todas estas versões, Lula sempre contou com o beneplácito dos intelectuais chapas-brancas para ecoar sua fala.
As lideranças condenadas pelo STF insistem em dizer que o partido tem que manter seu projeto estratégico. Qual? O socialismo foi abandonado e faz muito tempo. A retórica anticapitalista é reservada para os bate-papos nostálgicos de suas velhas lideranças, assim como fazem parte do passado o uso das indefectíveis bolsas de couro, as sandálias, as roupas desalinhadas e a barba por fazer.
A única revolução petista foi na aparência das suas lideranças. O look guevarista foi abandonado. Ficou reservado somente à base partidária. A direção, como eles próprios diriam em 1980, “se aburguesou”. Vestem roupas caras, fizeram plásticas, aplicam botox a três por quatro. Só frequentam restaurantes caros e a cachaça foi substituída pelo uísque e o vinho, sempre importados, claro.
O único projeto da aristocracia petista — conservadora, oportunista e reacionária — é de se perpetuar no poder. Para isso precisa contar com uma sociedade civil amorfa, invertebrada. Não é acidental que passaram a falar em controle social da imprensa e... do Judiciário. Sabem que a imprensa e o Judiciário acabaram se tornando, mesmo sem o querer, nos maiores obstáculos à ditadura de novo tipo que almejam criar, dada ausência de uma oposição político-partidária.
A estratégia petista conta com o apoio do que há de pior no Brasil. É uma associação entre políticos corruptos, empresários inescrupulosos e oportunistas de todos os tipos. O que os une é o desejo de saquear o Estado.
O PT acabou virando o instrumento de uma burguesia predatória, que sobrevive graças às benesses do Estado. De uma burguesia corrupta que, no fundo, odeia o capitalismo e a concorrência. E que encontrou no partido — depois de um século de desencontros, namorando os militares e setores políticos ultraconservadores — o melhor instrumento para a manutenção e expansão dos seus interesses. Não deram nenhum passo atrás na defesa dos seus interesses de classe. Ficaram onde sempre estiveram. Quem se movimentou em direção a eles foi o PT.
Vivemos uma quadra muito difícil. Remar contra a corrente não é tarefa das mais fáceis. As hordas governistas estão sempre prontas para calar seus adversários.
Mas as decisões do STF dão um alento, uma esperança, de que é possível imaginar uma república em que os valores predominantes não sejam o da malandragem e da corrupção, onde o desrespeito à coisa pública é uma espécie de lema governamental e a mala recheada de dinheiro roubado do Erário tenha se transformado em símbolo nacional.

Marco Antonio Villa é historiador e professor do Departamento de Ciências Sociais da Universidade Federal de São Carlos