quarta-feira, julho 31, 2013

O blog agora vai para a Veja.com

Prezados leitores, a partir de amanhã, esse blog será praticamente desativado, e todo o conteúdo por mim gerado ficará disponível no novo blog que começo na Veja.com. Por favor, assinem o RSS da página para receberem os links dos textos.

Obrigado,

Rodrigo.

Privatizem a Cedae

Fonte: G1
Rodrigo Constantino

Deu no GLOBOCedae, uma caixa-preta sem controle

Inaugurado com pompa e circunstância em dezembro, o prédio espelhado da Cedae, que impede a visão dos escritórios por quem passa pela Avenida Presidente Vargas, na Cidade Nova, reflete a falta de transparência da empresa de economia mista, controlada pelo estado, que fechou 2012 com lucro de R$ 162,9 milhões. Especialistas em saneamento enxergam na falta de controle uma das causas da deficiência operacional da Cedae. E mais: chegam a afirmar que a empresa atua irregularmente há seis anos e que as revisões tarifárias nesse período são ilegais. Isso porque, aos 38 anos de vida, a companhia — diferentemente de todas as concessionárias que prestam serviço nas capitais do Sudeste — ainda não tem regulação, contrariando a lei federal de saneamento (11.445/2007). E enfrenta problemas crônicos, como o lançamento de esgoto na Praia de Botafogo, a poluição da Baía de Guanabara e impasses no saneamento das favelas.

Segunda maior companhia de saneamento do país, a Cedae é responsável pelo abastecimento de água de 64 dos 92 municípios fluminenses e pela rede de esgoto em 33. Presta serviço a 11 milhões de pessoas (68% dos fluminenses). Na abertura da sessão legislativa deste ano, em 5 de fevereiro, o próprio governador Sérgio Cabral fez um mea-culpa: “Há algo no meu governo com que não estou satisfeito: é a questão do abastecimento da água e do tratamento de esgoto, porque estamos ainda muito aquém do que deveríamos estar”, reconheceu ele, prometendo investimentos e avanços no setor. O mesmo governador assinou, no fim do ano passado, um decreto prevendo que a Cedae só será controlada pela Agência Reguladora de Energia e Saneamento Básico do Estado do Rio (Agenersa) em agosto de 2015.


Mas o jornal coloca um ênfase muito grande na agência reguladora, e esquece o principal: a gestão estatal costuma ser sempre menos eficiente e menos transparente. Em meu livro Privatize Já, dedico um capítulo ao setor fundamental de saneamento básico. Segue um trecho:


A Companhia Estadual de Águas e Esgotos do Rio de Janeiro (Cedae), por exemplo, viu sua posição despencar no ranking de saneamento básico. De acordo com os dados do SNIS, o nível de atendimento da população fluminense por coleta de esgoto caiu da faixa de 82% em 2003 para 69% em 2009. A assessoria de imprensa da Cedae se recusou a comentar a queda, divulgada pelo jornal Valor Econômico em junho de 2012.


Em sua tese de mestrado na USP de 2005, Victor Toyoji de Nozaki analisou o setor de saneamento brasileiro. Para ele, “os resultados apresentados demonstram que os prestadores dos serviços de saneamento básico privados obtiveram uma performance melhor do que os públicos, tanto em questões administrativas, financeiras, operacionais e técnicas”. E mais: “são obtidas evidências de que a privatização está associada com uma significativa redução na mortalidade infantil”.

O descaso da gestão estatal acaba colocando em risco a vida das pessoas. Na tragédia em Campo Grande, com a morte de uma menina de apenas três anos, ainda é preciso concluir investigações. Mas tudo indica que foi falha da Cedae, que havia feito reparos recentes na adutora. Se fosse com uma empresa privada, não só os riscos seriam menores, como haveria maior responsabilização por um erro desses.

Nada justifica manter o estado na gestão dessas empresas. O estado não é um bom empresário. Ele deve cuidar somente de setores que não podem ou não devem ser administrados pela iniciativa privada com base nas leis de mercado e lucro. Não é o caso do abastecimento de água e esgoto. Há empresas privadas fornecendo esse serviço, de forma bem mais eficiente que o estado. Privatize já!

O Obama é prefeito em Maricá?

Rodrigo Constantino

Deu no GLOBOO exército de Quaquá: prefeito de Maricá contrata segurança privada por R$ 2,1 milhões

Quanto vale a segurança pessoal de um prefeito? No caso de Maricá, cidade da Região Metropolitana do Rio com 134 mil habitantes, a proteção do chefe do Executivo, Washington Quaquá (PT), custa R$ 2,1 milhões por ano, apesar de a Polícia Militar ter como dever garantir a proteção dele — que só anda de carro blindado — e de toda a população do município. O dinheiro público banca a despesa de um grupo de 24 homens armados durante 24 horas por dia. Por mês, o município desembolsa cerca de R$ 173 mil para evitar que Quaquá seja vítima de qualquer ataque. O serviço se estende ao vice-prefeito, professor Marcos Ribeiro, também do PT, que tem direito à metade desse contingente.

Os pagamentos são feitos à Guepardo Vigilância e Segurança Empresarial Ltda., empresa com sede em Niterói, também na Região Metropolitana. O prazo do contrato, publicado em 2 de maio deste ano no Diário Oficial do município, é de um ano e 17 dias. O termo firmado entre a prefeitura e a empresa prevê a “prestação de segurança pessoal privada armada no desenvolvimento de atividades de segurança de pessoas para atendimento das autoridades”.


Haja risco de vida para justificar um aparato tão grande de seguranças! Não será culpado quem pensar que é o próprio Barack Obama o prefeito de Maricá. Ou, então, podemos aderir a uma tese diferente: muitos petistas, apesar do discurso popular (populista?), quando chegam ao poder aderem ao estilo nababesco de vida dos típicos milionários, sendo que jogam a conta para ombros alheios.

E quem poderia acusá-los de não ter um "bom" exemplo em cima, no topo da hierarquia do partido? Alguém lembra que o metalúrgico Luís Inácio Lula da Silva, assim que eleito, usou carro oficial exclusivo em desfile para a sua cadela? Alguém lembra dos tecidos egípcios comprados para forrar os cômodos do Palácio? Alguém lembra de familiares do ex-presidente usando aviões da FAB por diversão?

O "argumento" usado por Quaquá para contratar mais de 130 "cumpanheiros" para cargos de confiança é que ele é contra o "estado mínimo". Percebe-se! Os petistas, pelo visto, apreciam um "estado máximo" para caber todos os seus camaradas. E quem paga a conta dessa farra toda? Ora bolas, nós, os defensores do estado mínimo.

terça-feira, julho 30, 2013

Freibettofobia

Rodrigo Constantino

Em artigo hoje na Folha, Frei Betto discorda do Papa Francisco quanto aos gays:

"Se uma pessoa é gay, procura Deus e tem boa vontade, quem sou eu, por caridade, para julgá-la? O catecismo da Igreja Católica explica isso muito bem. Diz que eles não devem ser discriminados, mas integrados à sociedade. O problema não é ter essa tendência. Não! Devemos ser como irmãos. O problema é fazer lobby."

São palavras do papa Francisco ao deixar o Brasil, no voo entre Rio e Roma. A mensagem é esperançosa, mas, ao contrário do que o papa diz, o problema no Brasil é o lobby antigay, liderado pelo deputado federal Marco Feliciano (PSC-SP), presidente da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara.

Ou seja, para o Papa, o problema não são os gays, mas o lobby do movimento gay, que são coisas bem diferentes. Já Frei Betto pensa que o problema está em Feliciano e no lobby antigay. Dou razão ao Papa nessa divergência, ainda que a postura de Feliciano seja realmente condenável.

O movimento gay tem cores autoritárias, intolerantes, e não se contenta em lutar por direitos individuais; quer enfiar goela abaixo dos demais sua visão de mundo, quase que obrigando todos a acharem a coisa mais linda do mundo um homem beijando outro homem. 

Além disso, há um claro ataque do movimento aos valores familiares tradicionais. Alguns querem inclusive retirar o nome de pai e mãe de documentos para não "ofender" filhos de casal gay. Absurdo dos absurdos.

Em outras palavras, o movimento gay, coletivista, não enxerga indivíduos, mas apenas uma categoria monolítica, como todo movimento coletivista. E apela para a vitimização para conquistar privilégios e para impor uma agenda cultural perigosa. Tudo em nome da "tolerância" e da "diversidade", sem tolerar diversidade alguma na prática.

Frei Betto tenta dar uma aula sobre fobias em seu texto depois. Ele diz:

Terapia é própria para obsessivos, como é o caso de quem odeia constatar que homossexual é uma pessoa feliz. Isto sim é doença: a homofobia, aliás, como toda fobia. E há inúmeras: desde a eleuterofobia, o medo da liberdade que, com certeza, caracteriza os fundamentalistas, até a malaxofobia, o medo de amar sobretudo quem de nós difere.

Em primeiro lugar, cabe perguntar: por acaso todo gay é feliz? Eis um comentário estranho do autor, que usa o significado do termo "gay" para concluir algo sem sentido. Podemos ter gays felizes e bem resolvidos com sua situação, e podemos ter gays infelizes e profundamente angustiados com sua condição. Devemos olhar indivíduos, insisto.

Sobre fobia, cabe perguntar: estamos falando, realmente, de medo? Quem tem medo de gay? Alguém por acaso olha um homossexual e sai correndo em pânico? De que? Parece claro que o termo é inadequado na largada. O que muitos sentem é certo desconforto, ou em alguns casos até mesmo repulsa natural, ao ver um homem beijando outro homem. Podemos debater se isso é fruto de preconceito, de herança social, ou do que for, mas não devemos chamar de medo uma reação de aversão. 

Curiosamente, Frei Betto fala de medo da liberdade (eleuterofobia). Ora, sabemos que Frei Betto é defensor do regime cubano até hoje, que, aliás, sempre perseguiu duramente os homossexuais (Che Guevara queria, esse sim, curar na marra os gays, ao contrário do pastor Feliciano). Alguém que aplaude a mais longa e sanguinária ditadura do continente deveria tomar mais cuidado ao falar em medo da liberdade. Na verdade, Frei Betto odeia a liberdade - dos outros. Por isso defende Fidel Castro.

Sobre o medo de amar quem de nós difere (malaxofobia), cabe perguntar ao Frei Betto o que ele sente pelos capitalistas, pelos empresários que querem lucrar, pelos conservadores, pelos liberais, e sim, por reacionários religiosos como Marco Feliciano. Ele "ama" todos estes? Porque não foi isso que ficou parecendo no começo do artigo. Duplo padrão, a marca registrada da esquerda.

Enfim, o texto de Frei Betto é mais um sinal de que é preciso redobrar o cuidado com esse movimento gay. Quando temos Frei Betto e Jean Wyllys, do PSOL, de mãos dadas entoando a defesa de uma causa, é melhor ficar de olho bem aberto. É quase certo que tomar o partido contrário irá te colocar no rumo certo. Sim, eu confesso que sofro de certa "freibettofobia". É que eu vi o que aconteceu em Cuba. E disso sim, eu morro de medo!

Xô, ufanismo!

Ação da CSN no ano. Fonte: Bloomberg

Rodrigo Constantino

Em sua coluna de hoje na Folha, o empresário Benjamin Steinbruch critica aqueles que ele chama de pessimistas infundados. Para o empresário, essa gente atrasa o país. Diz ele:

A pior coisa que pode acontecer a uma pessoa, a uma empresa ou a um país é se deixar levar por ondas de pessimismo. E o Brasil corre esse risco neste momento.

Se levarmos a sério discursos de alguns analistas, o país estaria à beira de uma hecatombe econômica e política.

A inflação estaria perigosamente descontrolada; a atividade econômica, no caminho inevitável da recessão; as contas públicas, totalmente desarrumadas; as contas externas, no rumo do default; a corrupção, em ritmo desenfreado em todas as esferas públicas e privadas.

Temos efetivamente problemas com inflação, atividade econômica, contas públicas, contas externas, corrupção e em muitas outras áreas. Mas só pessoas impregnadas por pessimismo doentio ou mal-intencionadas podem considerar esses problemas como insuperáveis.

Como tenho sido um desses "pessimistas", falo que, de minha parte, não considero o país perto de uma "hecatombe", tampouco considero nossos problemas "insuperáveis". Dito isso, nós temos, sim, graves problemas, que o empresário minimiza, e eles não são insuperáveis, mas exigem radical mudança no curso atual. Algo que não há indício algum de que o governo pretende fazer, ainda mais com esse tipo de negligência de grandes empresários.

Steinbruch adota a tese de que nossa inflação não incomoda tanto, e que boa parte foi um surto do preço de alimentos. Falso. Perigosamente falso. O empresário tem sido um dos maiores defensores da redução de juros, mesmo sem condições para tanto. O preço chegou, em forma de inflação elevada e resiliente. Fingir que o problema não existe não é solução; apenas agrava seu risco. Ele diz:

A inflação, de fato, subiu, ultrapassou a teto da meta de 6,5% ao ano. Foi puxada pela alta dos preços dos alimentos, impulso que já passou. O mais recente IPCA-15 mostrou que estamos próximos da inflação zero, com possibilidade até de deflação no índice oficial de julho, agora sob influência da queda dos custos de alimentos e transportes.

Isso não significa que acabaram as preocupações com a inflação, até porque os preços dos serviços continuam em alta e o efeito câmbio pode impactar preços neste segundo semestre. Mas também não é o caso de propagar a ideia de que está de volta o velho dragão dos tempos da hiperinflação.

A "hiperinflação" pode não ser uma ameaça iminente, mas já vivemos em um cenário de estagflação (baixo crescimento e alta inflação), o que é extremamente prejudicial ao país. Essa postura confortável que o empresário demonstra diante do quadro beira à irresponsabilidade. É o povo mais pobre que mais sofre com a alta de preços. 

Steinbruch não vê risco de recessão à frente também:

A atividade econômica está fraca, muito aquém do desejável. A indústria, principalmente, muito prejudicada pela concorrência das importações, reduziu investimentos. Mas o país não segue a rota inevitável da recessão.

Mas se o governo insistir na toada atual, esse risco é bem real. Como eu disse, ele não é "inevitável", mas para evitá-lo é preciso alterar o curso. O governo atual pretende fazer isso? Nenhuma pista, nenhuma evidência disso até agora. Muito pelo contrário...

Nesse trecho, Steinbruch endossa a tese bem furada e cara-de-pau, levantada pelo ex-presidente Lula e repetida pela presidente Dilma, de que as manifestações ocorrem por conta do sucesso da gestão nos últimos anos:

Imagino, portanto, que as ruas estão pedindo um novo salto de qualidade ao país. Beneficiadas pelos avanços das últimas duas décadas, reclamam por infraestrutura, educação, saúde e combate à corrupção.

Eis, talvez, o principal problema do atual governo e, pelo visto, de alguns empresários que apoiam o governo: vivem na ilusão e ignoram a realidade. O pessimismo que condenam é somente um realismo bem fundamentado. Conclui o empresário:

Nem otimismo ingênuo, nem pessimismo doentio. Essa seria uma boa norma de conduta para todos os que torcem pelo Brasil e batalham pela melhoria de vida dos brasileiros.

De acordo! Resta saber se é "pessimismo doentio" apontar para os grandes riscos de catástrofe à frente, caso o rumo permaneça o atual. Ou se é o caso de falar em "ufanismo boboca" para aqueles que pintam um cenário de céu de brigadeiro, inclusive justificando as manifestações que tomaram as ruas do país com base nesse quadro fantástico. 

É "pessimismo doentio", por exemplo, mostrar ao empresário que o valor da empresa que ele controla, a CSN, despencou esse ano, perdendo quase a metade de seu valor somente nesses seis meses? Ou seria isso mais um sinal de alerta que merece profunda atenção?

Dilma é Lula é Dilma

Fonte: O GLOBO
Rodrigo Constantino

Merval Pereira, em sua coluna de hoje no GLOBO, levanta a hipótese de que a polêmica fala da presidente Dilma, ao dizer em entrevista que o "Volta, Lula" não faz sentido pois Lula nunca saiu, pode não ter sido uma barbeiragem política que atesta sua nulidade, mas sim uma "trucada" naqueles "aliados" que atuam nos bastidores por sua substituição. Diz o jornalista:

Mas, durante o dia, conversando com um e com outro, acabei abrindo uma janela na interpretação para aceitar a possibilidade de que o que considerava uma autêntica “barbeiragem” da presidente pudesse ser na verdade audaciosa manobra: e se em vez de uma frase infeliz a presidente tivesse dado, isso sim, uma “trucada” nos que querem vê-la substituída por Lula na campanha eleitoral de 2014?

Ao explicitar a simbiose com o ex-presidente, Dilma esvazia a principal razão de uma eventual substituição sua por Lula. Ao dizer que Lula sempre esteve no governo, Dilma deixa nas entrelinhas a mensagem de que seus acertos e erros têm que ser divididos com o ex-presidente, o responsável final pela sua candidatura e, sobretudo, o parceiro do que tem sido feito no governo, o avalista de sua candidatura à reeleição.

Eu tendo a concordar com Merval Pereira. Por isso mesmo ainda não tinha escrito nada sobre a entrevista da presidente. À primeira vista, fica parecendo uma confissão desastrada de que ela não passa de uma marionete. Mas uma reflexão um pouco mais profunda mostra que ela pode estar deliberadamente se defendendo daqueles que tentam sabotá-la de dentro do próprio partido.

Na verdade, eu concordo com a presidente Dilma! E isso é muito raro. Não faz sentido clamar pelo retorno de Lula, pois o sucesso ou fracasso da gestão Dilma tem as impressões digitais do ex-presidente em todo lugar. Não vamos esquecer que foi o próprio Lula quem disse, na época das eleições, que ele era Dilma, e Dilma era ele. 

Dilma foi importante ministra do governo Lula desde o começo, foi ganhando mais poder no governo, foi escolhida para substitui-lo, e contou com o aval completo do ex-presidente. Não dá para fingir que tudo mudou de uma hora para outra, que ocorreram mudanças radicais. Os erros de Dilma são também os erros de Lula. Ele é responsável por isso.

Não apenas por ter escolhido sua sucessora e garantido seu total apoio a ela, como por ter plantado várias sementes dos problemas atuais. No afã de eleger seu "poste", Lula turbinou o crédito público e expandiu os gastos do governo. A conta chegou durante o governo Dilma, que ainda enfrenta mudança nos ventos externos. Não seria muito diferente se fosse o próprio Lula no governo.

Talvez um pouco menos de intervencionismo arbitrário, um pouco mais de traquejo político, um pouco menos de arrogância na gestão econômica. Mas boa parte dos problemas atuais de nossa economia estaria presente ainda. Estamos falando de uma gestão petista, não apenas de Lula ou Dilma. Estamos lidando com o lulopetismo e o desenvolvimentismo da equipe econômica, lembrando que Guido Mantega foi colocado lá pelo próprio Lula. 

Portanto, a "trucada" de Dilma faz todo sentido: não adianta tentarem separá-la de Lula. Dilma é Lula é Dilma. São ambos ligados de forma simbiótica um no outro. O resultado do governo Dilma é responsabilidade direta de Lula, como ele mesmo afirmou. 

Desapropriação em Guaratiba

Fonte: O GLOBO

Rodrigo Constantino

Deu no GLOBOPaes anuncia para esta terça-feira decreto de desapropriação em Guaratiba

O prefeito Eduardo Paes anunciou em coletiva de imprensa nesta segunda-feira (27/7) que publicará nesta terça o decreto de desapropriação do terreno onde foi montado o Campus Fidei, em Guaratiba. O loteamento foi prometido pela Igreja Católica, e idealizado numa conversa entre o prefeito e o arcebispo do Rio, dom Orani Tempesta, para ocupar o lugar onde ocorreriam os eventos de vigília e missa de envio no encerramento da Jornada Mundial da Juventude (JMJ). O prefeito defendeu a organização do evento, afirmando que a Igreja tinha todas as licenças ambientais, tanto do estado quanto do município, para a realização dos trabalhos de terraplanagem que foram realizados.
Mas eis o trecho que mais chamou a minha atenção:

Apesar de anunciar a desapropriação, Paes insistiu em afirmar que não sabe a quem pertence o terreno. Ele admitiu que a região também precisa de uma legislação urbanística nova, o chamado Plano de Estruturação Urbana (PEU), cujas discussões devem ser agilizadas nos próximos meses.
Tentando entender a coisa toda: o evento da igreja "mica" na área previamente organizada pois a prefeitura não contou com a possibilidade de chuva; a revolta é geral pela desorganização e incompetência; o governo cria, então, uma cortina de fumaça, com a notícia de que vai usar a área para criar um bairro popular novo; para dar continuidade ao anúncio, agora a prefeitura avisa que vai desapropriar o terreno; e, como se não bastasse isso, diz que nem sabe quem é o seu proprietário!

Como a prefeitura não sabe o proprietário do terreno é um mistério para mim. Será que ignora isso na hora de cobrar os impostos? Mas, do ponto de vista liberal, o que preocupa mesmo é essa flexibilização do direito de propriedade no Brasil. Os governos concentram poder demasiado para simplesmente "invadir, pilhar, tomar o que é nosso", como dizia a letra da música do RPM.  

Em nome de um bem coletivista qualquer, o governo se sente no direito de expropriar propriedade particular. Esse tipo de coisa ameaça esta que é a principal instituição do capitalismo. Acabamos com a propriedade privada de jure, mas nem sempre de fato. A insegurança que isso gera é enorme.

Nos Estados Unidos, durante o auge das ferrovias, o governo expropriou muitas terras para fins "nobres". As ferrovias estatais acabaram falidas. Enquanto isso, empresários construíam suas próprias ferrovias, algumas transnacionais, e como não contavam com a prerrogativa estatal de simplesmente decretar a expropriação, tiveram que comprar as terras demandadas. Muitas dessas ferrovias foram bem-sucedidas.

Quando escuto que o governo vai expropriar uma propriedade, tombar outra, ou impor um Apac que impede reformas modernizantes em prédios velhos, tudo sempre em nome do bem-geral, confesso que tenho calafrios. E quando vejo isso com o objetivo de construir um novo bairro popular do zero, penso em Ayn Rand e tenho ainda mais calafrios. 

É muito poder concentrado em governantes que se arrogam uma sabedoria que simplesmente não possuem. E quem paga a conta somos todos nós, os proprietários à mercê desses governantes. Afinal, de quem é a propriedade?

segunda-feira, julho 29, 2013

Scheinkman culpa governo por economia travada

Rodrigo Constantino

Em entrevista para a Folha, o economista José Alexandre Scheinkman coloca a culpa de nossa economia travada na incompetência e na ideologia equivocada do governo. Seguem alguns trechos relevantes:

Sim, e essas empresas melhoram ao se tornar formais. Mas, como há um tamanho máximo de faturamento para ficar dentro das faixas de tributação no Brasil, há um desestímulo na busca por crescimento por parte dessas empresas e isso prejudica a eficiência da economia.

O ideal seria diminuir os impostos para as firmas maiores e trazê-las mais perto das outras.
Há os casos de proteção setorial. As pessoas esquecem que a política setorial dificulta a vida das indústrias que usam o insumo do setor protegido. Elas acabam não podendo se tornar tão eficientes quanto as de países que têm acesso ao mesmo insumo a preço relativamente menor.

Um amigo meu diz --e eu concordo-- que um dos grandes problemas do governo brasileiro é a incompetência. Eu não consigo explicar isso por malevolência, por um pensamento de que o governo quer um país atrasado.

Às vezes as políticas são extremamente prejudiciais ao país por incompetência --por exemplo, quando o governo controla o preço da gasolina. Isso levou ao aumento do congestionamento e da poluição e prejudicou uma das poucas tecnologias importantes criadas no Brasil, a da indústria do etanol.

Não imagino que o governo decidiu gerar essas consequências. Mas alguém teve a brilhante ideia de, entre aspas, controlar a inflação mantendo o preço da gasolina estável e não pensou nas consequências.
Há uma questão também de ideologia. Há reformas que precisavam ser feitas, mas que não atendiam à ideologia do governo. Acho que agora o governo entendeu que precisa trazer mais investimento privado para áreas como ferrovias, portos etc.

Outro problema importante é a baixa taxa de poupança. Então, o governo cobra muito imposto, mas tem gastos enormes e pouca capacidade financeira para investir, além da falta de capacidade que eu já mencionei de competência do setor público.
Excesso de intervencionismo econômico, altos impostos para permitir elevados gastos públicos, desconfiança com o livre mercado, protecionismo comercial, enfim, as mazelas de nossa economia são conhecidas, e foram intensificadas durante o governo Dilma. O Brasil precisa, mais que nunca, resgatar uma agenda de reformas liberais, reduzindo o papel estatal e ampliando o do mercado. Ou isso, ou continuaremos travados.  

O mal de Bresser-Pereira

Rodrigo Constantino

Em sua coluna de hoje na Folha, Luiz Carlos Bresser-Pereira fala sobre a "banalidade do mal", tema ressuscitado pelo filme em cartaz sobre Hannah Arendt (que ainda não tive a oportunidade de ver). De fato, o grande mal é possível quando parece banal, e essa foi a sacada da filósofa. Como resume o colunista:

Em vez de simplesmente retratar Eichmann como o gênio do mal, como esperavam seus leitores, em vez de descrevê-lo como um homem violento e racista, ela o descreveu como um medíocre burocrata que cumpria ordens, um homem normal sem capacidade de avaliar o mal que praticava.

E faz então uma descoberta fundamental: identificou a banalidade do mal, o fato de que ele só se torna imenso quando se torna banal e, por isso, compartilhado por muitos.

Até aqui vamos bem. Mas eis que Bresser-Pereira resolve dar exemplos dessa "banalidade do mal" mais modernos. E aí ele sai pela tangente. Coloca o terrorismo islâmico ao lado da Guerra do Iraque e da guerra civil na Síria. Ele diz:

A partir dessa definição, saliento três manifestações maiores do mal neste início de século: o terrorismo islâmico contra inocentes, a Guerra do Iraque, e a guerra civil "pela democracia" na Síria. Nos três casos, vimos ou estamos vendo uma violência imensa contra seres humanos inocentes.

Não há nada que justifique as mortes causadas pelo terrorismo islâmico, assim como pela Guerra do Iraque, e pela guerra na Síria, apoiada pela Arábia Saudita e por potências ocidentais. Nos três casos, vemos a banalidade do mal.

Existem inúmeros motivos para se discordar da Guerra do Iraque. Mas colocá-la no mesmo barco do terrorismo islâmico é absurdo. Ignora-se que antes dessa guerra o país era dominado por uma cruel ditadura, que já havia banalizado o mal totalmente. Ignora-se que Saddam Hussein não cumpria os acordos firmados com a ONU de inspeção, e que o ditador financiava terroristas. Enfim, ignora-se completamente que derrubar um ditador sanguinário não pode ser comparado a explodir um prédio repleto de civis com o intuito deliberado de matá-los. 

Mas a tática é conhecida. Ayn Rand foi perspicaz ao descrevê-la em seus livros. Quando você quer atacar sua sogra, você diz que repudia igualmente o veneno das cobras, a mordida do rato, e o sermão da sogra. O alvo fica evidente. O mesmo faz a esquerda sempre: há críticas a serem feitas contra o socialismo, o nazismo e o capitalismo. O que se quer com isso? Difamar o capitalismo, claro!

Como nada nesse mundo é perfeito, tudo será passível de crítica sempre. Quem tenta jogar no mesmo saco coisas tão diferentes por conta disso, parece ter um alvo específico. Ninguém é perfeito, logo... o estuprador, o pedófilo e o sujeito que mentiu para a mulher são todos "pecadores". Quem se quer condenar com esse tipo de discurso?

Espero ter deixado claro que colocar a Guerra do Iraque ao lado dos ataques terroristas islâmicos e o que se passa na Síria só pode ter uma intenção: atacar a Guerra do Iraque e seu principal responsável, o governo americano. Bush e Osama bin Laden acabam retratados como igualmente terríveis. Não faz o menor sentido.

Ao término do artigo, Bresser-Pereira ainda dá um deslize final:

O mal está, portanto, entre nós. Está nesses episódios, está nos crimes associados às drogas, está na violência e no desrespeito contra os pobres. Mas é difícil para nós nos indignarmos, porque esse mal é banal. Só quando ele deixa de sê-lo, e a sociedade se torna indignada, pode ele ser combatido e, em alguns casos, vencido.

O trecho por mim grifado diz tudo: quer dizer que a violência e o desrespeito contra os pobres é condenável e representa a "banalidade do mal", mas contra os mais ricos não? Roubar da classe média pode? Violentar uma moça de família abastada não tem problema? Nota-se a demagogia e o sensacionalismo, típicos da esquerda. O mal de Bresser-Pereira é (ser) seletivo.

Pondé em Miami

Rodrigo Constantino

Em sua coluna de hoje, o filósofo Luiz Felipe Pondé fala da angústia do "eu", sempre em busca de satisfazer expectativas de terceiros. Pondé descasca essa tirania dos desejos na era moderna, esse "faz tudo" pelas aparências, os embustes dos programas de "autoconhecimento" à jato, enfim, ele aponta para vários sintomas de uma das principais doenças da modernidade.

Mas não quero falar disso. Quero pegar um trecho de seu texto mais profundo e focar em um aspecto bem mais raso e superficial. Receio que o bebê seja jogado fora junto com a água suja do banho. Eis a passagem em questão:

Outro dia, contemplava pessoas num aeroporto embarcando para os EUA com malas vazias para poder comprar um monte de coisas lá.

Que vergonha. É o tal do "eu" que faz isso. Ele precisa comprar, adquirir, sentir-se tendo vantagem em tudo. O "eu" sente um "frisson" num outlet baratinho em Miami. O mundo faz mais sentido quando ele economiza US$10. E o pior é que, neste mundo em que vivemos, faz mesmo sentido. Qualquer outra forma de sentido parece custar muito mais do que US$ 10.

Entendo perfeitamente o ponto do filósofo. Como morador da Barra da Tijuca há três décadas, posso atestar com inúmeros exemplos concretos a existência desse tipo de gente em abundância. São pessoas "bregas", como diz o próprio Pondé, que pensam ser possível preencher um vazio existencial com roupas de grife (muitas já ultrapassadas nos States) ou aparelhos tecnológicos de ponta. Não podem.

Dito isso, considero injusto jogar todos no mesmo saco. Quem é movido por isso, quem é "escravo" dessas paixões consumistas, quem, enfim, confunde seu próprio "eu" com a marca estampada em sua roupa ou seu celular, sem dúvida representa o alvo típico do ataque de Pondé. Trata-se não só de algo brega, como algo um tanto triste do ponto de vista existencial.

Mas nem todos que vão para Miami de malas vazias sofrem desse mal. É perfeitamente factível alguém ter outros interesses, outros valores, um pensamento mais denso e profundo sobre a vida, e ainda assim não gostar de rasgar dinheiro, ou pior, de deixar boa parte do que gasta nas mãos corruptas do nosso governo.

Fazer compras em Miami é apenas algo racional. Encontra-se de tudo a um preço bem menor. Em certos casos, para quem pretende comprar muita coisa, talvez um enxoval de casamento ou para o bebê, consegue economizar bastante dinheiro mesmo incluindo a passagem. Não estamos falando de US$ 10, mas de centenas de dólares.

Essa quantidade enorme de gente que viaja para Miami para fazer compras pode ser perfeitamente um indício do sintoma que Pondé aponta no texto, mas pode muito bem ser evidência de outra doença, mais prosaica, mais trivial: os preços absurdos dos mesmos produtos no Brasil, basicamente devido aos impostos escorchantes. Como diz um amigo meu, compro em Miami porque sou pobre; se fosse rico, comprava no Brasil mesmo.

Por fim, é preciso ter cuidado com intelectuais e filósofos que pairam acima desses desejos materialistas. Não é o caso do próprio Pondé, que volta e meia expõe a hipocrisia dessa gente, que finge gostar de filmes chatos iranianos enquanto assiste escondido a novela da Globo. São esquerdistas que condenam o consumismo do capitalismo portando uma bolsa da Louis Vitton, pois ninguém é de ferro.

Claro que os excessos consumistas devem ser condenados. Como eu disse, é muito triste alguém ser "escravo" de uma marca de roupa ou celular, tudo pelas aparências, pelos outros. É muito vazia, muito superficial, uma vida assim. Mas é perfeitamente normal usufruir dos produtos modernos, sem se deixar cegar por isso. Usá-los, e não ser usado por eles. 

Para os que conseguem isso, nada melhor do que pagar um preço bem menor por eles, pois ninguém gosta de rasgar dinheiro, nem intelectuais. E para isso, nada melhor do que comprar em Miami, onde tudo é muito mais barato. De quebra, ainda há bons restaurantes. Convido Pondé para um bate-papo profundo no Nobu. Falaremos de Dostoievsky, Camus e Kafka, comeremos muito bem, e a conta será menor do que a de um restaurante mediano paulista. Que tal?

PS: Absurdo mesmo é o governo brasileiro insistir com um limite ridículo de US$ 500 por pessoa para trazer de fora, sendo que a polícia alfandegária está cada vez mais atenta, revirando até roupas das malas em busca de mais arrecadação com esses impostos indecentes. 

sábado, julho 27, 2013

A marcha dos indecentes

Fonte: Folha

Rodrigo Constantino

Deu na FolhaParticipantes da Marcha das Vadias distribuem camisinhas e chocam peregrinos no Rio

A Marcha das Vadias que desfila na tarde sábado (27) na praia de Copacabana, na zona sul do Rio, aproveitou a estrutura de grades montada para o papa Francisco chegar ao palco e fez uma passarela de provocações à Igreja Católica.

A postos para esperar o papa, os peregrinos debruçados nas grades se diziam chocados. Mulheres seminuas usando santas como objetos fálicos, distribuição farta de camisinhas, mulheres beijando mulheres e cartazes onde o rosário forma um pênis são algumas mostras do que os fiéis, mesmo sem querer, tiveram que assistir para não perder o lugar para ver o papa.

A advogada Maria da Glória Sabugo veio de Porto Alegre para ver o sumo pontífice e estava indignada. "É terrivelmente ofensivo, eles tem todos os dias para fazer isso, mas eu no fundo tenho pena deles", disse enquanto na sua frente dois homens se beijavam.

Duas mulheres, uma representando Cristo carregando a cruz e outra com roupa de Nossa Senhora, também chocavam por onde passavam. Elas traziam mensagens como "Até Nossa Senhora foi avisada". Nem o papa escapou no protesto: "A verdade é dura, o papa apoiou a ditadura".

A polícia também era provocada pelos cerca mil manifestantes. "Não acabou, tem que acabar, eu quero o fim da policia militar" e "Cabral, cadê o Amarildo", eram palavras de ordem cada vez que se avistava uma cabine policial.

O que dizer? Será que é mesmo preciso comentar isso? Só nos resta sentirmos pena dessas pessoas, que confundem liberdade de expressão com libertinagem em público e ofensa gratuita aos demais, pensam que estado laico é estado antirreligioso. 

Essas pessoas levantam bandeiras em nome da tolerância, mas se mostram as mais intolerantes de todas com os outros. Não conseguem respeitar nem mesmo as senhoras que desejam somente escutar uma mensagem de conforto do Papa Francisco. 

Querem chocar por chocar, e pensam que assim estão lutando pela liberdade, contra a opressão, a hipocrisia, o moralismo. Conseguem apenas mostrar como faz falta uma boa educação, que imponha limites, que ensine valores morais, decentes. 

Eis o resumo da ópera bufa: essa gente patética acha que marcha em nome da liberdade, mas marcha apenas em nome da indecência. 

A inevitável reforma da Previdência

Rodrigo Constantino

O editorial do GLOBO toca hoje em um ponto nevrálgico do Risco Brasil: nosso modelo previdenciário. O jornal diz:

O chamado bônus demográfico no Brasil deve se estender até meados da década seguinte. Isso significa que, até lá, o país terá um número crescente de pessoas em idade para estudar, trabalhar, poupar, investir e consumir, simultaneamente. Chama-se bônus porque nesse período há proporcionalmente menos pessoas nos dois extremos do “octógono” demográfico (antes havia uma “pirâmide”). Ou seja, a população economicamente ativa supera, por considerável margem, a não ativa.

No entanto, as curvas demográficas também mostram que, ao fim desse período do “bônus”, a população “envelhecerá” gradativamente. A redução nos índices de fecundidade por mulher — um fenômeno característico de países que se urbanizam, superam o analfabetismo e gradualmente aumentam a média de anos de estudo dos habitantes — fará com que a população se estabilize dentro de um prazo que já não está tão distante. O número de crianças e adolescentes até 15 anos deve diminuir não só em termos relativos mas também absolutos. E tal tendência ocorrerá ao mesmo tempo em que aumentará a expectativa média de vida dos brasileiros. Cada vez mais pessoas viverão por mais anos.

Essa transformação de “pirâmide” para “octógono” demográfico exigirá mudanças substanciais das políticas públicas, no que se refere à educação, à saúde, à mobilidade urbana e, principalmente, no sistema previdenciário.

Enquanto que, por um lado, o número de beneficiários da previdência oficial crescerá progressivamente, o de contribuintes se estabilizará, e até declinará. Trata-se de uma equação explosiva no longo prazo, pois, se hoje o déficit do sistema previdenciário já é elevado, ao fim do “bônus” demográfico virará uma bola de neve, se nada for feito.

Por isso, a reforma da previdência, para torná-la financeiramente mais sustentável no longo prazo, terá de ser realizada ainda nessa fase do “bônus”. O governo Dilma conseguiu negociar com o Congresso a regulamentação do fundo de previdência complementar para os novos servidores públicos federais, substituindo o atual sistema de aposentadoria dos funcionários. Todos os novos servidores ficarão sujeitos ao teto de benefícios do INSS, e acima disso vão auferir rendimentos provenientes do fundo de previdência complementar. Desarmou-se, assim, uma bomba-relógio, no caso da sistema de aposentadoria dos servidores federais.

Mas no Regime Geral de Previdência Social, sob responsabilidade do INSS, há ainda uma reforma para ser concluída. As regras em vigor estimulam a aposentadoria precoce por tempo de contribuição e embute graves distorções no pagamento de pensões aos cônjuges e dependentes de segurados que faleceram. Politicamente é uma reforma difícil de ser negociado em fim de mandato, inclusive porque no Congresso há uma pressão no sentido contrário. Trata-se, então, de uma agenda inadiável para o início do próximo governo, independentemente de quem vencer as eleições presidenciais de 2014.


Eu meu artigo A Previdência Ponzi, argumento que a única solução mais definitiva para o problema seria privatizar o sistema previdenciário. Nada mais eficiente e mais justo. Cada indivíduo poupa em uma conta individual, que investe em ativos sólidos para garantir a aposentadoria. O modelo coletivista atual gera uma bolha insustentável. Eis minha conclusão: 

Reformas paliativas, como redução dos privilégios, aumento da idade para aposentadoria e outras coisas do tipo, podem aliviar um pouco a dor, adiando o estouro da bolha. Mas não vão resolver o problema de verdade. A verdadeira solução é uma revolução total no modelo, partindo para contas individuais em uma previdência privada. Além de ser bem mais eficiente, pois reduz o poder de estrago do governo nas valiosas poupanças individuais, é também o modelo mais justo. Afinal, cada um deve ser responsável pelo seu próprio futuro, poupando do seu esforço para garantir uma velhice tranqüila. Quanto menos o governo puder meter a mão nessa poupança, melhor para os aposentados. Atualmente, eles são vítimas forçadas de uma farsa, um esquema fraudulento de pirâmide, uma verdadeira Previdência Ponzi.

Egito em clima de guerra civil

Fonte: O GLOBO

Rodrigo Constantino

Deu no GLOBODezenas de mortos em confrontos entre partidários de Mursi e soldados no Cairo

As Forças Armadas egípcias confrontaram com violência partidários do presidente deposto Mohamed Mursi que protestavam no Cairo. Segundo o Ministério da Saúde, os confrontos na madrugada deste sábado deixaram 38 mortos, todos civis, mas a Irmandade Muçulmana, aliada de Mursi, afirma que o número de vítimas é superior a 200, além de mais de 4 mil feridos.

De acordo com Gehad al-Haddad, porta-voz da Irmandade, os confrontos foram iniciados antes da primeira oração do dia, por volta das 4h (23h de sexta-feira no horário de Brasília). Milhares de islâmicos que faziam vigília em uma mesquita no bairro de Medina Náser tentaram bloquear a ponte Seis de Outubro, uma das principais do Cairo e que atravessa o Rio Nilo, o que levou a uma reação da polícia.

— Eles não estão atirando para ferir, estão atirando para matar — disse al-Haddad.

Não há ainda versão oficial detalhada de eventos, mas as autoridades dizem que eles usaram apenas gás lacrimogêneo para dispersar os manifestantes. No entanto, fontes do hospital confirmaram que a maioria das vítimas morreu de ferimentos de bala. De acordo com várias testemunhas, a batalha era claramente desigual, a polícia com armas de fogo, enquanto a maioria dos manifestantes estavam armados apenas com paus e pedras.

Os líderes da Irmandade Muçulmana acreditam que a verdadeira intenção da polícia foi expulsar à força partidários de Mursi que estavam acampados em torno da mesquita de al-Audawiya Rabá, o principal foco de protestos.

Poucas horas antes do massacre, o ministro do Interior, Mohamed Ibrahim, disse que ao jornal estatal “Al Ahram” que o governo "vai acabar em breve de forma legal" com os protestos de islamitas, referindo-se especificamente às manifestações que ocorrem perto da mesquita. Ibrahim justificou a medida tendo em vista as reclamações e denúncias feitas por moradores e disse que o Ministério Público iria emitir uma ordem de desocupação, o que ainda não aconteceu.

Médicos de um hospital de campanha afirmaram à rede de televisão al-Jazeera que 75 pessoas foram mortas perto da mesquita.

O derramamento de sangue acontece um dia depois de apoiadores e opositores de Mursi terem participado de comícios rivais em todo o país, com centenas de milhares de pessoas nas ruas.


Não podemos ignorar que Mursi contou com amplo apoio popular no começo, e com os aplausos do governo americano também. Mas este parecia não querer enxergar que o conceito de "democracia" para os seguidores de Mursi era bem diferente do nosso conceito de democracia ocidental. Para a Irmandade Muçulmana, ela não passava de um instrumento para impor a sharia - a lei islâmica - a todos. 

Quando isso começou a ficar mais claro, boa parte da população do Egito tomou as ruas pedindo sua cabeça. Mas ainda há enorme parcela que deseja justamente isso. Daí o confronto inevitável. O Egito, como a Turquia e outros países da região, está em plena disputa para ver se há alguma chance de um governo democrático e eleito que seja mais secular, ou se somente regimes autoritários são capazes de segurar o ímpeto do fanatismo religioso, como tem sido nas últimas décadas.

Muitos "progressistas" acharam que era possível e até sonharam com uma grande revolução democrática nesses países, celebrando a "Primavera Árabe" como celebram a Revolução Francesa. Esqueceram como esta terminou: com sangue e terror, levando a uma ditadura. Talvez seja cedo demais para achar que os próprios povos islâmicos querem algo que se assemelhe aos modelos ocidentais de tolerância religiosa. 

Recomendo a leitura da resenha que diz do livro Spring Fever, de Andrew McCarthy. A "democracia islâmica" no Oriente Médio pode ser apenas uma ilusão ocidental, fruto de um desejo muito grande de crer que os anseios populares por lá são semelhantes aos dos próprios indivíduos que vivem na civilização ocidental. Não são!

sexta-feira, julho 26, 2013

Quem é presidente afinal?

Rodrigo Constantino

Deu no EstadãoDilma decide com Lula não mexer na gestão

Após longa conversa com ex-presidente, ela pediu ajuda para conter o racha entre PT e PMDB e concluiu que não fará mudanças sob pressão

A presidente Dilma Rousseff não cortará nenhum dos 39 ministérios nem pretende mexer no primeiro escalão agora. Em conversa de três horas com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, na quarta-feira, em Salvador, Dilma mostrou preocupação com a queda de popularidade do governo, registrada após as manifestações de rua de junho, mas disse que não vai ceder, nesse momento, a pressões por mudanças na equipe.

A portas fechadas houve muita reclamação sobre o comportamento do aliado PMDB e também do PT. Não foi só: Dilma pediu ajuda a Lula para “enquadrar” o PT, que, no seu diagnóstico, não está colaborando como deveria para defender o governo e o plebiscito da reforma política. Para a presidente, divisões na seara petista e o coro do “Volta Lula” prejudicam a governabilidade.

Embora os números da pesquisa CNI/Ibope só tenham sido divulgados ontem, Dilma e Lula sabiam na reunião que a rejeição aos políticos afetaria a avaliação não só da petista, mas também dos governadores. Apreensiva, a presidente chegou a perguntar a auxiliares qual seria a repercussão na mídia da má avaliação do governo, em meio à visita do papa Francisco ao Brasil.

O levantamento do Ibope mostra que o porcentual dos que consideram o governo Dilma “ótimo” ou bom” caiu de 55% para 31% em um período de um mês, após as manifestações de rua. Outros números indicam que a avaliação pessoal da presidente despencou de 71% para 45% e que metade dos entrevistados não confia nela.

Segundo o Estado apurou, Dilma e Lula expressaram contrariedade não só com o racha no PT, mas também com a atitude do presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), que pregou publicamente o corte de ministérios como solução para a crise política. A avaliação reservada é a de que o PMDB quer “surfar” na onda dos protestos.

O ex-presidente Lula nunca soube manter uma postura republicana. Enquanto FHC tem sido exemplar em seu papel de ex-presidente, Lula parece ainda governar, e com o aval da própria presidente. Com esse tipo de atitude, os petistas não podem reclamar quando acusam a presidente de "poste", ou marionete. Quando a situação política esquenta, ela corre para o ex-presidente. Isso só enfraquece sua própria imagem perante o país e o Congresso.

Já sobre o corte de ministros, sendo oportunismo político do PMDB ou não, o fato é que só sob pressão popular essa reforma tem chance. Ao menos o PMDB leu melhor a mensagem das ruas do que a presidente e o PT, que tentaram tirar da gaveta um projeto de Constituinte ou plebiscito que estava pronto desde 2007. Cortar ministros seria uma mensagem simbólica bem mais forte do que propor um plebiscito para financiamento público de campanha.

É lamentável o papel da presidente Dilma nessa confusão toda. Se ela nunca mereceu a fama de estadista, agora ela merece mais que nunca a alcunha de marionete. A pergunta é legítima: quem é presidente afinal?

Os bons na política

Rodrigo Constantino

Merval Pereira resumiu bem o discurso do Papa Francisco sobre a participação de bons cristãos na política, com P maiúsculo. Diz o jornalista:

O Papa Francisco fez ontem, na visita à favela da Varginha, seu discurso mais político, referindo-se às recentes manifestações ocorridas no país de maneira positiva, encorajando a que os jovens permaneçam na sua luta contra a corrupção. Com outras palavras, retomou análises que fizera anteriormente, desde que assumiu, sobre a nobreza da ação política. Para ele, envolver-se na política é a obrigação de um cristão, pois a ação política é “das formas mais altas de caridade”.

A política com P maiúsculo, como definiu em outra ocasião, visa o bem comum e “nós cristãos não podemos fingir de Pilatos e lavar as mãos”. Ontem, ele se referiu especialmente aos jovens que “possuem uma sensibilidade especial frente às injustiças, mas muitas vezes se desiludem com notícias que falam de corrupção, com pessoas que, em vez de buscar o bem comum, procuram o seu próprio beneficio".

Mas o Papa instou a que “nunca desanimem, não percam a confiança”, insistindo em que a ação política pode mudar a realidade, “o homem pode mudar”. Em palestras anteriores na Itália, logo depois de ser eleito Papa, ele falou mais diretamente sobre a atividade política ao ser perguntado por um estudante jesuíta qual seria a atitude evangélica correta nos dias de hoje.

Eis um grande dilema para liberais: participar ou não do jogo político? Eu mesmo costumo sofrer pressão de leitores, e quando divulgo em meu canal que vem por aí uma grande novidade (vem uma na semana que vem!), muitos pensam que se trata de uma eventual candidatura. Qual deve ser a postura dos liberais, ou das pessoas decentes em geral, em relação a política?

Em minha opinião, elas devem participar, sim. Mas não é para todos. Atuar na política, ainda mais na nossa, demanda um estômago preparado, um grau de ética muito elevado, uma disposição de pagar um alto preço individual. Mas não sejamos ingênuos: não é possível simplesmente chegar lá e mudar "isso tudo que está aí". 

Dito isso, em política não há vácuo. Se as pessoas melhores não participarem, as piores terão o caminho totalmente liberado. Facilitar o acesso a eles é a garantia de que a podridão não só vai se perpetuar, como aumentar. A vida em sociedade exige um espaço político; não podemos sonhar com a ausência dessa via, e adotar uma postura apolítica, ou pior, antipolítica. 

Portanto, tendo a concordar com o Papa Francisco: as pessoas de bem deveriam tentar resgatar, sim, a ideia de nobreza da política, permitindo o retorno de figuras honradas a este importante ofício. Já as tivemos no passado.

Mas faço algumas ressalvas. Não podemos cair na ideia infantil de que seres "incorruptíveis" chegarão lá e, de cima para baixo, irão mexer em tudo e acabar com a sujeira toda. Liberais não podem ser tão ingênuos, pois entendem que o mecanismo de incentivos faz toda a diferença. Ou seja, temos que insistir, mais ainda, na luta no campo das ideias, para que o poder em si seja reduzido e descentralizado.

É preciso lembrar sempre que o poder para fazer o bem é, também, o poder para fazer o mal. E a probabilidade maior é de que esse poder seja tomado não pelos melhores, mas pelos piores, ou por gente que será corrompida pela tentação no processo. O poder deve ser menor. A via política deve ter seu escopo reduzido.

Concluo, então, endossando a fala do Papa Francisco, sobre a importância de se valorizar novamente a política com P maiúsculo, e ao mesmo tempo reforçando a bandeira liberal de que a guerra é cultural, de que o estado não deve ser visto como esse instrumento fantástico para fazer o bem, pois esse é o primeiro passo para instaurar o inferno por aqui.

Aqueles que não se interessam pela política serão governados pelos que se interessam. E tudo que o mal precisa para triunfar é que as pessoas de bem nada façam. Arnold Toynbee e Edmund Burke ou Platão fizeram alertas importantes. 

Pessoas decentes do Brasil todo, uni-vos! 

PS: De minha parte, adianto que não tenho interesse em participar da política por enquanto, pois prefiro atuar no campo das ideias. Mas o Partido Novo conta com meu total apoio, assim como faço novamente um apelo para que invistam em boas ideias; associem-se ao Instituto Liberal, que agora presido. 

Lambança no Campus Fidei

Fonte: O GLOBO

Rodrigo Constantino

Por ato falho, quase coloco Campus Fidel no título, logo após a palavra lambança. É que uma coisa me remete à outra. Mas é Campo Fidei mesmo, e a lambança não pode ser atribuída a São Pedro. Estamos falando da incompetência das autoridades cariocas. Deu no GLOBO:

Bem em frente ao Campus Fidei, em Guaratiba, a localização da birosca de Lauro dos Santos era considerada privilegiada. A proximidade com peregrinos representaria um aumento substancial de vendas e a chance de melhorar a qualidade de vida da família. Para reforçar o estoque, foi necessário contar com a ajuda de amigos e parentes, que emprestaram seus cartões de crédito para a compra de bebidas e alimentos. Nesta quinta, porém, o sonho de lucrar com a Jornada Mundial da Juventude virou um pesadelo. A transferência da programação da Zona Oeste para Copacabana deixou o comerciante com dívidas, e levou seus clientes para cerca de 50 km de distância dali.

— Esperava vender muito, mas agora só ficou o prejuízo — lamentou Santos. — Nem sei o que vou fazer agora.


O comerciante não foi o único atingido pela lama de Guaratiba, que impediu a realização do evento no bairro. Muitos de seus vizinhos conseguiram alugar suas casas para peregrinos, que não irão mais para o local. Além disso, centenas de pessoas arranjaram trabalhos temporários no Campus Fidei. Entre elas, a filha do dono da birosca, Cláudia dos Santos, que seria parte da equipe de limpeza para ganhar R$ 80 por dia nas madrugadas de amanhã a domingo.

— Estávamos contando com este dinheiro — disse Cláudia. — Durante meses aturamos os transtornos de morar do lado de uma obra enorme. Minha casa chegou a ficar rachada, alguns tijolos da obra que estou fazendo na laje até a caíram. Convivi com o barulho de geradores e máquinas. Apesar de tudo isso, não teremos nenhum benefício. É frustrante.

Realmente, é algo espantoso o governo preparar tudo ignorando a possibilidade de chuva! Qualquer um que trabalha com eventos coloca isso nos preparativos, sabe que precisa contar com o imprevisto. Um tablado suspenso para impedir o lamaçal, um toldo que proteja da chuva, essas seriam medidas de precaução que não poderiam ter faltado. Mas, pelo visto, consultaram o Cacique Cobra Coral e foram dormir tranquilos, seguros de que não iria chover. Como disse um dos entrevistados:

Será que eles não sabiam que existe chuva, que essa era uma área de mangue, e que poderia ter muita lama?

quinta-feira, julho 25, 2013

O último pilar ruindo

Fonte: Folha

Rodrigo Constantino

O nível de emprego costuma ser lagging enquanto indicador econômico. Na verdade, ele é mais um efeito do que qualquer coisa. Quando um ciclo de excessos possíveis graças à bonança creditícia se esgota, isso só bate na taxa de desemprego depois. 

Isso acontece porque demitir e contratar custa muito caro, especialmente no Brasil. Os empresários esperam até o limite para tomar essa decisão drástica de mandar gente embora.

É o que parece estar começando a acontecer no Brasil. O editorial da Folha relata que desde 2009 o país não tinha um ano que terminava com a taxa de desemprego maior do que começou. Diz o jornal:

São consistentes os sinais de deterioração da economia brasileira. Às evidências já conhecidas soma-se agora a taxa de desemprego, que, pela primeira vez desde 2009, apresenta uma alta em relação ao mesmo mês do ano anterior.

O dado negativo no mercado de trabalho é particularmente ruim na atual conjuntura, em que os indicadores de confiança na economia também têm constituído um quadro desalentador.

[...]
É justamente nessa armadilha que caiu o governo federal ao conduzir a política econômica de forma errática e interferir, muitas vezes de forma autoritária, na dinâmica empresarial de vários setores.

O que ainda mantinha a esperança em uma recuperação era o mercado de trabalho. De fato, era algo surpreendente a resistência do emprego no cenário de baixo crescimento do PIB.

Pois agora o aparente paradoxo começa a se resolver --pelo lado ruim. A taxa de desemprego de junho, de 6%, ainda é, em si, baixa, mas a primeira elevação do índice (na comparação anual) desde agosto de 2009 indica mudança de tendência no mercado de trabalho.

É certo que as manifestações recentes contribuíram para a queda dos indicadores de confiança do consumidor, já que elas chamaram a atenção para diversos pontos de descontentamento. Não se descarta alguma melhora nesse item.

Quanto ao mercado de trabalho, porém, é improvável uma reversão. Por ser custoso contratar e demitir, o emprego é o último a sair da inércia diante de mudanças de cenário. Mas, uma vez em movimento, é difícil de parar.

Em meu mais recente artigo no GLOBO, fiz justamente um alerta sombrio para esse quadro. Eu disse:

Portanto, eis a situação: vamos muito mal das pernas, com baixo crescimento, parcos investimentos, e alta inflação. Mas isso tudo em um cenário em que ainda há abundância de capital nos mercados e forte crescimento chinês. Como efeito disso, ainda temos um quadro de pleno emprego. Pergunta: o que acontece com a inadimplência dos bancos se o desemprego subir, lembrando que o governo vem aumentando em mais de 20% ao ano o crédito público? Pois é...

O nível baixo de desemprego é, ainda, o grande ativo político da presidente Dilma, e o que sustenta a economia patinando, em vez de ela afundar de vez. Será que este último pilar está agora ruindo também? Se a taxa de desemprego subir rapidamente, o Brasil viverá uma crise de grandes proporções. Há muita gente pendurada em dívida cujo pagamento depende do emprego. Apertem os cintos...

Debate com a esquerda

Rodrigo Constantino

O economista Marcelo Miterhof, que trabalha no BNDES e escreve na Folha, já foi chamado por mim de "Paul Krugman tupiniquim", pois suas propostas são muito semelhantes. Em sua coluna de hoje, ele volta a destilar sua visão esquerdista que faz jus ao apelido que dei. Marcelo diz:

O problema é que, apesar de boas sacadas quanto ao poder da competição e da busca do lucro, não é assim que o capitalismo funciona melhor.

Por exemplo, grandes empresas são mais eficientes. O poder de mercado torna mais fácil acumular recursos para inovar. Como dizia Schumpeter, um carro pode correr porque tem freios.

O Estado também tem papel central na economia. Os gastos públicos estabilizam o capitalismo, criando uma demanda que impulsiona o investimento e, as sim, a produtividade. Além disso, para a esquerda, distribuir renda não é somente um valor moral, mas também uma forma de acelerar o crescimento: pobres consomem mais os ganhos adicionais que obtém.

A principal diferença entre direita e esquerda está na ênfase que cada uma respectivamente dá à competição e à cooperação.

Essas são formas de interação em alguma medida sempre presentes nas relações humanas. Exagerar na ênfase numa ou outra direção cria problemas. Sem cooperação, a força inovadora do capitalismo é desagregadora, como ocorreu até a crise de 29. Sem competição, o comunismo foi pouco dinâmico e repressor.

O Estado de bem-estar social foi uma inovação pública que consolidou a força do capitalismo ao torná-lo mais equilibrado, mas exageros cooperativos também ocorrem. Por exemplo, há casos de seguro-desemprego na Europa em que é demasiadamente pequena a diferença entre trabalhar ou não.

Vamos por partes. Quem disse a ele que empresas maiores são mais eficientes e inovadoras? Será que ele não sabe que Microsoft, Dell, Apple e tantas outras gigantes nasceram minúsculas, em garagens? 

Gastos públicos como estabilizadores do capitalismo? Sério mesmo? Quase todos os países enfrentam graves problemas por conta dos excessos de gastos públicos, que acabam desestabilizando suas economias. Essa idéia repetitiva de que os gastos públicos criam demanda é uma falácia já refutada por Bastiat em 1850! Para gastar, o governo precisa, antes, tirar de alguém! 

Sobre pobres consumirem mais que ricos e impulsionarem as economias, temos outra grande falácia: o crescimento sustentável necessita de investimentos produtivos, não de mais consumo apenas. Esquerdistas acham que o rabo balança o cachorro, que mais consumo é que gera mais produção, e não o contrário. Ao tirar dos mais ricos e distribuir aos mais pobres, o crescimento se dá apenas no primeiro momento, sacrificando o futuro do país.

Quanto à cooperação e à competição, temos aqui uma falsa dicotomia. Quem disse a ele que os mercados livres não contam com enorme grau de cooperação? O capitalismo é feito disso! A competição faz parte, e é fundamental para as inovações, o progresso, os melhores produtos e serviços. Mas o livre mercado é cooperação do começo ao fim! Basta entrar em um supermercado e ver a quantidade de produtos à venda. Cooperação absoluta para nos atender bem!

O que Marcelo quer dizer é "intervencionismo" versus "liberdade", mas nesses termos fica mais feia sua mensagem. Ele acredita na imposição de cima para baixo, pelo governo e seus tecnocratas. Cooperação compulsória é contradição em termos. 

Coloca a "terceira via", o estado de bem-estar social, como essa grande solução intermediária é agir de má-fé, pois a história nos mostrou que esse modelo gerou ineficiência, engessou a economia, prejudicou inclusive os mais pobres. Ao menos o economista reconhece que em certos locais não trabalhar ou trabalhar passou a significar o mesmo ganho financeiro!

A tentativa de monopolizar os fins nobres, típica da esquerda, vem à tona no desfecho do artigo:

Por fim, uma boa questão levantada pelo liberal-conservadorismo é se haveria uma contradição entre o intervencionismo econômico e as liberdades individuais.

Não creio. Defender o Estado de bem-estar social é de meu interesse individual. Não sou a favor de distribuir renda por ser bonzinho, e, sim, porque é o melhor jeito de tornar o Brasil mais rico e porque uma sociedade mais equilibrada é boa para mim. Afinal, viver em meio a uma grande pobreza me põe sob risco.

Ora bolas, eu também não quero viver em meio a tanta pobreza! E justamente por isso defendo o capitalismo liberal, sem tanta intervenção como a defendida pelo economista do BNDES, pois esse intervencionismo, na prática (e não nos sonhos dele), produz apenas mais miséria.